Não aconselho nenhum aposentado, pensionista ou servidor público a tomar empréstimo consignado ainda que os juros sejam mais baixos do que as taxas oferecidas normalmente pelo mercado. Pois, infelizmente, várias são as situações capazes de causar dores de cabeça ao consumidor, sendo uma delas as surpresas que o contrato reserva e os serviços fornecidos sem solicitação prévia.
Acontece que muita gente não tem noção de que, quando assina os papéis de seu empréstimo, essas inescrupulosas financeiras incluem ali um termo de adesão padronizado para utilização de um cartão de crédito com a previsão de descontos em seu salário ou benefício previdenciário. E aí, repentinamente, o consumidor pode se ver contemplado com a disponibilização da totalidade do limite de crédito do cartão na conta corrente por meio de um TED.
Ao receber em conta um inesperado valor creditado, o que muitas das vezes acontece no final do empréstimo consignado, a pessoa pode nem perceber de onde veio o dinheiro. Como poucos consumidores dispõem de tempo suficiente para examinar seus extratos bancários, a grande maioria nem nota que, sem a sua prévia solicitação, a financeira forneceu um novo serviço cometendo abuso, como é previsto no inciso III do artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Geralmente as vítimas desses ilícitos empresariais só vão suspeitar de algo errado quanto observam nos seus contracheques os respectivos débitos relativos à cobrança do mínimo do cartão de crédito, crescido dos encargos do crédito rotativo, causando-lhes grande surpresa e perplexidade. Há quem pense estar sendo alvo de alguma fraude e, frequentemente, se vê consumidores a ingressar com ação judicial alegando a inexistência de relação jurídica quanto ao cartão de crédito, sendo que, na verdade, o que não foi solicitado seria a disponibilização dos valores do limite creditício em conta. Então, como resultado disso, encontramos decisões judiciais que acabam sendo benéficas ao banco porque a exposição dos fatos é feita sem o conhecimento total da realidade. Senão vejamos a seguinte ementa de um julgado bem desfavorável do Tribunal de Justiça daqui do Estado do Rio de Janeiro:
"APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER E INDENIZATÓRIA. CONTRATO BANCÁRIO. Autora alega que não celebrou contrato de uso de cartão de crédito com descontos em seu benefício previdenciário. Réu prova o negócio jurídico devidamente firmado, que acabou sendo reconhecido pela Autora em réplica. Mudança da causa de pedir para vício de vontade, acolhido pelo Juízo a quo para anular o contrato. A causa de anulação de qualquer negócio jurídico tem de ser comprovada e jamais presumida, como in casu. O fato de ser a Autora pessoa idosa não lhe retira, por si só, a plena capacidade para a vida civil. Contrato redigido de forma clara e de fácil compreensão, que deve ser considerado plenamente válido. Consequentemente, legítimos são os descontos e não há que se falar em repetição e, tampouco, compensação moral. PROVIMENTO DO RECURSO DO RÉU, PREJUDICANDO O AUTORAL." (Apelação n.º 0457861-80.2014.8.19.0001 - Des(a). LEILA MARIA RODRIGUES PINTO DE CARVALHO E ALBUQUERQUE - Julgamento: 29/08/2016 - VIGÉSIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL CONSUMIDOR)
Ora, se casos assim acontecem nos processos cíveis da Justiça comum, nos quais a parte é obrigada a constituir advogado ou estar assistida por um defensor público, o que não deve estar ocorrendo nos Juizados Especiais desse Rio de Janeiro afora onde a representação do consumidor em primeira instância é facultativa nas demandas de até vinte salários mínimos?!
Entretanto, mesmo que tais contratos de empréstimos venham acompanhados de um termo de adesão prevendo a disponibilidade de um cartão de crédito, há que se observar o fato dos consumidores jamais terem solicitado o "saque" cujos juros são absurdos e representam o oposto dos interesses de quem deseja empréstimos baratos. Aliás, muitos nunca fizeram qualquer compra com o seu plástico e tão somente usaram do consignado.
Mas refletindo sobre quando uma dívida dessas irá terminar, um raciocínio plausível a ser feito é que os descontos devem se justificar apenas pelo depósito feito na conta do consumidor, a fim de evitar-se seu enriquecimento sem causa, tendo, porém, como indevida a cobrança, por ausência de solicitação do serviço de "saque". E aí, considerando o direito do banco de reaver a quantia disponibilizada em conta, basta apurar-se a diferença, ficando a pena da devolução em dobro, prevista no parágrafo único do artigo 42 do CDC, condicionada à constatação de má-fé do fornecedor.
Concluo que o melhor a ser feito é alertar o consumidor sobre o que ele anda assinando quando decide fazer um empréstimo consignado e também para ficar atento com relação ao fornecimento, sem solicitação prévia, de algum serviço. Pois, afinal, tratam-se de financeiras que costumam lidar com um público já idoso (boa parte dos clientes são aposentados) em que seus vendedores, não raramente, tentam de maneiras abusivas se prevalecer da fraqueza ou ignorância da pessoa, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços.
De hoje em dia cada vez mais é preciso muito cuidado. Anda meio mundo para enganar outro meio.
ResponderExcluirGostei
Bjos
Pois é, Larissa. O que mais me deixa perplexo seria o fato dessas práticas abusivas serem praticadas por instituições financeiras legalizadas sem que recebam uma punição adequada pelo que fazem. Uma minoria de consumidores ingressa com ações judiciais em que uns ganham e outros perdem sendo que muitas das vezes a exposição dos fatos é mal feita pela desinformação e os juízes nem compreendem a lesão causada por tais bancos, os quais lucram muito apesar de pagarem aqui e ali algumas indenizações de quatro dígitos...
ExcluirNão sei em outros países como é que funciona a defesa do consumidor, mas o que falta aqui são ações de alcance coletivo capazes de porem fim a essa farra fãs instituições financeiras em cima dos aposentados.
Um abraço e obrigado pela visita ao blogue.
Oi, sei que não tem relação direta ao tema e peço desculpas por isso mas tenho uma dúvida. Sofri um acidente de trânsito onde quebrei a perna. Isso em 2010 quando eu tinha 17 anos e isso me impossibilitou várias coisas sendo a maior delas seguir carreira Militar . Entrei com um processo contra o autor do acidente e sua seguradora (na realidade estava mais interessado em vencer da seguradora). Na audiência de conciliação eu nem mesmo tive a oportunidade de me expressar e o Juiz em momento algum me fez qualquer pergunta ou ao menos dirigiu a palavra a mim. Perdi e meu advogado apelou, agora está em segunda instância e tenho medo de acabar perdendo. Ainda existem chances de vencer o processo? Obrigado pelo seu tempo e parabéns pelo Blog.
ResponderExcluirBoa noite, Guilherme.
ExcluirPelo que colocou, você já possui um processo e está sendo assistido por um advogado, o qual está acompanhando a ação e até interpôs recurso para reverter a situação.
De acordo com a ética profissional, não é correto um advogado dar opiniões sobre o processo de um colega, sendo preciso que o cliente desenvolva uma relação de confiança com o seu procurador.
Compreendo a sua angústia e o drama que tem passado em sua vida, mas, sobre o seu processo, não posso opinar sendo que pela pergunta formulada, se irá ganhar ou vencer em segunda instância, nenhum advogado tem como dizer porque não existem causas ganhas e nem perdidas.
Ótima semana e obrigado por sua visita ao blogue.