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quarta-feira, 5 de abril de 2017

Até o TSE ouvir a "serpente"...



Durante a sessão de ontem do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no tão esperado julgamento da chapa Dilma-Temer, o ministro Herman Benjamin reclamou abertamente da falta de celeridade no feito tendo em vista o pedido de ouvir novas testemunhas e a concessão de prazo adicional para que haja nova manifestação das partes. Respondendo aos questionamentos da ministra Luciana Lóssio, o relator da ação assim disparou:

"Não podemos transformar esse processo num universo sem fim. Não podemos ouvir Adão e Eva para que intimem a serpente. Vamos ser transparentes, ministra Luciana, não há necessidade de nós não dizermos o que está por trás de tudo isso. Temos que evitar a procrastinação. Esse processo não é para ouvir Adão e Eva e possivelmente a serpente (...) Não somos nenhum de nós noviços e nem os brasileiros todos que estão sentados aqui e lá fora. Sabemos exatamente o que está diante de nós. Vamos analisar os fatos tal como estão postos. Somos sete juízes que, graças a Deus, temos condições de analisar os fatos com a maior imparcialidade. Agora, não vamos querer ouvir Adão, Eva e a serpente."

Se recorrermos ao texto bíblico pertinente à fala do excelentíssimo ministro, veremos que, no julgamento de Adão e Eva, Deus não pediu o depoimento da serpente. A breve passagem do capítulo 3 de Gênesis, mais precisamente nos versículos de 9 a 13, mostra que o Supremo Juiz apenas fez perguntas ao primeiro casal, muito embora a divinal sentença tenha incluído também o maldito réptil:

"Mas o Senhor Deus chamou o homem, perguntando: 'Onde está você?' E ele respondeu: 'Ouvi teus passos no jardim e fiquei com medo, porque estava nu; por isso me escondi'. E Deus perguntou: 'Quem lhe disse que você estava nu? Você comeu do fruto da árvore da qual lhe proibi comer?' Disse o homem: 'Foi a mulher que me deste por companheira que me deu do fruto da árvore, e eu comi'. O Senhor Deus perguntou então à mulher: 'Que foi que você fez?' Respondeu a mulher: 'A serpente me enganou, e eu comi'. Então o Senhor Deus declarou à serpente: 'Já que você fez isso, maldita é você entre todos os rebanhos domésticos e entre todos os animais selvagens! Sobre o seu ventre você rastejará, e pó comerá todos os dias da sua vida. Porei inimizade entre você e a mulher, entre a sua descendência e o descendente dela; este lhe ferirá a cabeça, e você lhe ferirá o calcanhar'". (Gn 3:9-15;NVI)

Tentando preencher com a minha imaginação a lacuna bíblica, acredito que o Senhor teria julgado desnecessário mandar a serpente falar naquela sumária audiência. Pois, se levarmos em conta o que diz a teologia cristã, segundo a qual o tentador de Eva seria Satanás (o anjo banido dos céus por querer ser igual ao Criador), certamente Deus já conhecia a peça de outros carnavais. Logo, tendo em vista a folha de antecedentes criminais do diabólico réu, seria uma perda de tempo determinar a sua oitiva. Até porque o Julgador, por ser Onisciente, nem precisaria colher provas de modo que, se o homem e a mulher foram chamados para depor, tal ocasião seria tão somente para lhes ajudar na defesa, nunca prejudicá-los.

Todavia, o TSE parece que pretende ouvir não só o diabo como o inferno inteiro! Pois, além do ex-ministro de Dilma, Guido Mantega, e as três testemunhas arroladas pelo Ministério Público (João Santana, Monica Moura e André Santana), os nobres magistrados discutiram ainda a possibilidade de intimar presidentes de partidos políticos, os quais já haviam respondido ao Tribunal por escrito. Ou seja, o julgamento que era previsto para começar e terminar esta semana, provavelmente só deverá acontecer no segundo semestre do ano. E, tendo em vista os recursos a serem interpostos para o STF, duvido que o trânsito em julgado ocorra ainda em 2017.

Durante a sessão de ontem, o ministro Napoleão Nunes Maia ironizou o colega relator quando declarou não ter interesse em retornar ao paraíso, exceto se fosse antes da expulsão de Adão e Eva. Porém, a sua fala infeliz me fez pensar sobre o quanto a Justiça brasileira caminha contrariamente à evolução das coisas. Até porque voltar ao Éden antes da queda significaria rejeitar todo o aprendizado que a humanidade experimentou em sua longa trajetória de tentar reconstruir o Paraíso com o seu auto-esforço e decisões equivocadas, prendendo-se eternamente à infância consciencial.

Prefiro já nem dizer mais nada. Como disse Jesus no Sermão Profético do Monte das Oliveiras, na sua referência à "abominação da desolação" (Mt 24:15), quem lê entenda. Afinal, sacrilégios contra a Constituição e as leis é o que mais assistimos neste país...


OBS: A ilustração acima refere-se à obra do pintor gótico alemão Mestre Bertram que viveu entre os século XIV e XV da era comum.

2 comentários:

  1. Tenho pena de, como português, a viver em Portugal, não tenha bases para comentar o tema. Acredito que muito haverá para dizer. Mesmo assim, deixo aquele abraço de admiração pelo autor do texto.
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    Dia feliz

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    1. Prezado Nuno. Mesmo que não tenha uma base informática para comentar o assunto, fico feliz c sua visita e participação neste blogue. Volte sempre! Ótimo final de semana!

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