"Quando o pagamento houver sido estipulado por mês, deverá ser efetuado, o mais tardar, até o quinto dia útil do mês subsequente ao vencido." (CLT, art. 459, § 1º)
Não é incomum no Brasil o servidor ser surpreendido com o não pagamento de seu salário pelo Poder Público. Ainda mais nas bagunçadas prefeituras e governos estaduais falidos onde falta seriedade da parte dos gestores escolhidos por nós.
Inegavelmente, quando passa o dia do seu pagamento, e o funcionário não encontra o valor depositado em conta, ele já sofre um grande abalo emocional, fazendo com que já se sinta tenso e preocupado. Ainda mais se estiver cheio de contas para pagar como dívidas, as faturas de serviços essenciais (tipo água e luz) prestes a vencer, a mensalidade da escola dos filhos, o aluguel ou a prestação de seu imóvel não quitado, o plano de saúde, a compra de algum medicamento de uso contínuo e o alimento de sua família.
Em termos psicológicos, poucos sabem lidar com situações assim, as quais geram uma profunda insegurança no trabalhador. Porém, é preciso estar preparado em todos os sentidos para o enfrentamento do problema! Pois, além de ser recomendável manter uma reserva de dinheiro na poupança (o ideal é que tenhamos sempre provisões para sobrevivermos por uns seis meses), é prudente estar juridicamente orientado a fim de que as medidas acertadas sejam tomadas.
O primeiro passo quando o seu salário não entra na conta é procurar saber o motivo, buscando informações se o problema foi apenas isolado ou se envolve a todos os demais servidores, bem como se aconteceu alguma falha no sistema da Administração Pública. Caso o não pagamento tenha sido um erro individual, formalize logo uma reclamação, preferencialmente em duas vias, através do Protocolo (ou se utilize de uma comunicação segura através da Ouvidoria), pedindo a imediata inclusão do salário atrasado em folha suplementar.
Obviamente que o seu requerimento protocolizado irá gerar um processo administrativo obrigando o órgão competente a se posicionar e fornecer uma resposta formal. Você estará produzindo a prova de que entrou em contato com a Administração Pública na tentativa de solucionar um problema dentro de um prazo razoável e poderá juntar tal documento numa futura ação judicial, quer seja impetrando um mandado de segurança ou pelas vias normais, hipótese em que o seu advogado requererá a tutela provisória de urgência (a antiga "tutela antecipada" do art. 273 do CPC/1973) cumulando-a com um eventual pedido de reparação de danos.
A meu ver, se o pagamento não veio com a folha suplementar, o servidor já estaria no momento certo de ajuizar a sua demanda. Pois se trata de uma situação que passa a comprometer a subsistência do trabalhador e de sua família, violando um valor social constitucionalmente reconhecido chamado trabalho e isso sobreleva o direito de quem laborou em ser remunerado pelos serviços prestados.
É cabível o recebimento de danos morais?
Não posso deixar de comentar sobre uma questão que costuma ser indagada tanto por leigos como pelos profissionais do Direito, a qual diz respeito ao recebimento dos danos morais pelo não pagamento de salário. Pois, não raramente, alguns servidores ingressam com ação judicial requerendo uma reparação financeira por causa das privações sofridas com o atraso na remuneração, a inclusão de seu nome nos cadastros de proteção ao crédito (pelo inadimplemento de obrigações perante terceiros), o seu sentimento de indignação e os diversos abalos psicológicos gerados.
Com muita tristeza hei de reconhecer que o Judiciário brasileiro ainda é predominantemente restrito ao reconhecimento da lesão extra-patrimonial diante de tais casos. No entender de muitos magistrados, o mero descumprimento de obrigações legais e contratuais, por si só, não causaria dano moral, sendo o prejuízo apenas material. Porém, não é esta a visão que tenho e luto por uma mudança.
Ora, se por um lado o Judiciário costuma conceder medidas de urgência a fim de que o servidor público não permaneça sem o seu salário, em razão de seu caráter alimentar, chegando, inclusive, a ser proferidas decisões determinando o bloqueio das contas públicas para a entrega do dinheiro ao trabalhador, por que negar o direito a uma indenização por danos morais?! Porque se é algo que diz respeito à subsistência do indivíduo, torna-se claro que a lesão pode ser considerada como presumida ou in re ipsa, expressão latina ainda bem presente nos nossos tribunais.
Bem refletindo, se a 4ª Turma do STJ reconheceu em 2009 como dano moral presumido a lesão não patrimonial decorrente do atrasos de voos nos aeroportos (REsp 299.532), por gerar desconforto, aflição e transtornos ao passageiro que arcou com o pagamentos de um serviço prestado de forma defeituosa, qual o motivo de se aplicar entendimento diverso no que se refere à falta de pagamento dos salários dos servidores públicos na data do vencimento?! Afinal de contas, ter a própria subsistência comprometida não teria uma dimensão muito maior para o trabalhador do que, por exemplo, um turista perder algumas horas numa viagem de férias?!
Diante do relativismo reinante na nossa jurisprudência, encorajo os meus colegas advogados a lutarem incansavelmente pela causa até que os nossos magistrados se convençam da ocorrência do abalo moral nessas situações sobre a falta de pagamento de salários. Pois considero fundamental defendermos a dignidade do trabalhador perante os tribunais sendo certo que a aplicação da legislação trabalhista precisa acompanhar os avanços dos primeiros quinze/vinte anos do Código de Defesa do Consumidor.
Uma ótima semana para todos!
Em Portugal muitos patrões não pagam a tempo e horas. Outros vão pagando aos poucos o que faz com que o ordenado não renda. Enfim, misérias...
ResponderExcluirAbraço
Bom dia, Gil
Excluir(ou talvez boa tarde aí em Portugal)
Situações semelhantes infelizmente ocorrem aí é aqui. E no caso dos trabalhadores da iniciativa privada, torna-se mais difícil para o trabalhador exercer o seu direito enquanto o servidor público costuma ter mais liberdase para ingressar com ação judicial sem ser dispensado por isso.
Por essas e outras sou favorável às greves e outras medidas de pressão que se façam necessárias.
Um abraço e obrigado por sua visita ao blog com comentários.