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sábado, 8 de maio de 2021

Um Salmo que os nossos governantes deveriam ler mais



Nesta semana, eu e Núbia (re)lemos um poema da Bíblia, supostamente atribuído ao rei Davi, que, embora seja pouco comentado, possui grande importância para ilustrar o modelo de governante que deveríamos ter. Trata-se do pequeno Salmo 101, com oito versículos apenas, que assim diz:


"Cantarei a misericórdia e o juízo; a ti, SENHOR, cantarei. Portar-me-ei com inteligência no caminho reto. Quando virás a mim? Andarei em minha casa com um coração sincero. Não porei coisa má diante dos meus olhos. Odeio a obra daqueles que se desviam; não se me pegará a mim. Um coração perverso se apartará de mim; não conhecerei o homem mau. Aquele que murmura do seu próximo às escondidas, eu o destruirei; aquele que tem olhar altivo e coração soberbo, não suportarei. Os meus olhos estarão sobre os fiéis da terra, para que se assentem comigo; o que anda num caminho reto, esse me servirá. O que usa de engano não ficará dentro da minha casa; o que fala mentiras não estará firme perante os meus olhos. Pela manhã destruirei todos os ímpios da terra, para desarraigar da cidade do Senhor todos os que praticam a iniqüidade" (Salmos 101:1-8; versão Almeida Corrigida)


Acredita-se que o texto citado fosse utilizado nas cerimônias de coroação dos antigos monarcas de Israel e que tinha a ver com a cultura de um antigo Estado religioso de uns três mil anos atrás.


Todavia, mesmo com os nossos valores atuais de separação entre Igreja e Estado, há preciosas palavras ali que expressam o nosso ideal de liderança e gestão, a começar pelas palavras "misericórdia" e "juízo", mostrando que o governante deve ser bondoso e compassivo, mas, ao mesmo tempo, um homem justo.


O termo traduzido por "coração sincero" relaciona-se um pouco com a ideia de transparência, mas é algo que tem mais a ver com a personalidade do gestor e a sua atitude interior. Porém, é incompatível com as atitudes falsas e enganadoras tão comuns aos políticos de hoje no Brasil.


Observa-se, na sequência textual, a escolha do escritor bíblico por não se satisfazer com o mal, sendo o direcionamento do seu olhar uma opção também por querer ver as coisas boas e não aceitar uma situação injusta. Até porque se tratava de um rei soberano, na época com poderes absolutos, e que, sendo um homem justo, precisaria manter uma conduta de não ser condescendente com as coisas erradas quando estas chegassem ao seu conhecimento. Daí o salmista manifestar o seu ódio às obras dos que se desviam (dos que praticam a maldade).


Por outro lado, o poema nos leva a entender a opção de Davi por não compor o seu ministério com homens maus, o que constitui um grande desafio para os políticos da atualidade quando fazem os seus equivocados aliançamentos julgando-os como necessários. Porém, ao dizer que o homem perverso se apartará dele, o autor deixa claro que não quer se associar com tais pessoas às quais falta o atributo da integridade.


Outra postura muito importante do salmista é não aceitar os caluniadores covardes. Isto é, aquela gente que, às escondidas, propaga mentiras e fakenews a fim de difamar o próximo. Seu compromisso é com a verdade de modo que ele se propõe a combater esse tipo de atitude destrutiva e corrosiva dentro da sociedade na qual vive.


Também o soberbo e o orgulhoso não terá lugar em seu reino, mas o rei afirma que procurará as pessoas que forem "fiéis" no meio de seu povo. Ou seja, aquelas que são de boa conduta irão servi-lo (ser nomeada para algum cargo público de importância e de autoridade dentro do país).


Assim, o Salmo 101 termina com o compromisso de que o governante levará a justiça ao seu reino combatendo a corrupção e o crime, o que se inclui no vocábulo traduzido por "iniquidade". Isto significa que o rei promete ser incansável na sua luta para a promoção da justiça, numa época em que os Poderes estatais achavam-se ainda reunidos na pessoa do monarca, com exceção do ministério religioso que, segundo a legislação aplicável, deixada por Moisés, era exercido com exclusividade pelos sacerdotes.


Retornando aos tempos atuais, acredito que muitos desses valores precisam ser cultivados pelos nossos políticos/juristas antes mesmo de tomarem posse de qualquer cargo público. E, apesar dessa separação institucional entre Igreja e Estado, formalizada no Brasil desde a Proclamação da República (1889), creio que a aplicação do Salmo 101 permanece adequada aos nossos dias, independentemente de qualquer religião seguida pela autoridade. Pois é questão de ética e de atitude.


Mais do que um juramento recitado perante os homens, as palavras que dão sentido ao texto aqui comentado precisam estar no íntimo de quem pretende liderar uma nação. Logo, a mesma seleção que o salmista faz na escolha dos seus subordinados, devemos lembrar na hora de definirmos o voto porque numa democracia o poder emana é do povo.

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