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sexta-feira, 30 de julho de 2010

Por que não querem deixar a OAB propor projetos de lei?

Uma nova polêmica surgiu na Câmara dos Deputados. Trata-se da possibilidade da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) propor projetos de lei ordinária e complementar relativos à administração da Justiça, conforme defendido peça Proposta de Emenda Constitucional (PEC) n.º 305/2008 de autoria do deputado Pompeo de Matos (PDT-RS).

Para alguns deputados, como José Genoino (PT-SP) e Bonifácio Andrada (PSDB-MG), a PEC afrontaria as prerrogativas do Poder Legislativo. No entender do parlamentar petista, a iniciativa pode enfraquecer o Parlamento porque, a seu ver, o poder apenas deve ser exercido diretamente pelo povo ou por seus representantes. Para deputados contrários à proposta, a OAB, por ser uma instituição privada, não poderia invadir uma esfera que eles entendem como sendo exclusiva do Poder Público.

No entanto, além de retrógrada, a visão exposta por esses deputados encontra-se equivocada.

A princípio, qual é a natureza jurídica da Ordem? Seria a OAB uma entidade privada, ou ela integra a Administração Pública Indireta Federal na qualidade de autarquia profissional?

Diferente de outros sindicatos profissionais, das ONGs e das inúmeras associações sem fins lucrativos existentes no país criadas do dia para a noite, a existência histórica da OAB é contemplada constitucionalmente e representa os advogados na indispensável administração da Justiça juntamente com a Magistratura e o Ministério Público.

Pensando em termos políticos de maneira mais ampla, é salutar para a democracia que entidades representativas da sociedade possam propor projetos de lei tematicamente relacionados com a sua esfera de atuação, o que de modo algum esvazia a importância do Poder Legislativo, o qual continuará decidindo se transformará ou não em lei as propostas enviadas pela OAB.

A meu ver, entidades da sociedade civil devem não somente propor projetos de lei como também acompanhar o processo legislativo, no sentido de seus representantes irem à Plenário e comparecer nas reuniões das comissões da Câmara Federal para fins de defesa da proposta. E creio que tudo isto só vai somar para o fortalecimento do Poder Legislativo porque desperta mais a atenção do cidadão para as atividades do Congresso Nacional, gerando um enriquecedor dinamismo ao nosso Parlamento.

Ora, se a OAB já tem legitimidade constitucional para propor ações diretas de inconstitucionalidade e ações declaratórias de constitucionalidade perante o Judiciário, por que a Ordem, devido a uma razão de simetria, não pode ser participante da elaboração de leis? Por que determinados deputados querem tanta exclusividade se, na realidade, todos os parlamentares não passam de meros representantes da população que apenas nos substitui na atividade de legislar?

É bem provável que a participação de entidades da sociedade civil no processo legislativo incomode os nossos deputados por inúmeras razões, conlusive ocultas. Uma delas, parece-me que, com a aprovação da PEC, novas pessoas estariam surgindo no cenário político, o que de certa maneira ameaça a permanência de certos políticos já que a cada quatro anos a maioria deles consegue se re-eleger, o que faz do nosso Congresso um verdadeiro feudo de parlamentares medíocres.

Caso seja aprovada, a PEC trará diversos benefícios que poderão ajudar no melhor funcionamento da Justiça, o que, na visão do secretário-geral da OAB, Dr. Marcus Vinícius Furtado Coelho, pode diminuir a burocracia quanto à reforma do Judiciário, conforme noticiado pela Agência Câmara:

“Se alguém quiser mudar o funcionamento de uma vara no interior de São Paulo, por exemplo, a proposta tem que ser aprovada primeiro pelo Tribunal Regional Federal de São Paulo, depois pelo Conselho de Justiça Federal, em seguida pelo Conselho nacional de Justiça para, só então, o Supremo Tribunal Federal (STF) enviar o projeto ao Congresso. No novo modelo, a própria OAB poderia apresentar diretamente a proposta ao Legislativo”.

Não podemos nos esquecer que os interesses dos advogados para que a Justiça funcione com capacidade para julgar as causas em tempo satisfatório beneficia também a maioria da sociedade brasileira. Constantemente se vê nos jornais que o cidadão comum fica com o seu processo por anos parado em Varas onde um único juiz tem que dar conta de mais de vinte mil ações. Porém, da mesama maneira que o advogado precisa que seu processo ande para ele ganhar melhor o seu sustento, o cidadão comum também anseia por mais agilidade para que o seu problema seja logo resolvido.

Por outro lado, a administração da Justiça deve estar de acordo com uma realidade proclamada há mais 120 anos, uma vez que os órgãos do Poder Judiciário são todos públicos. Logo, a iniciativa quanto à organização judiciária não deve ser exclusiva dos Tribunais, cabendo também à OAB e ao Ministério Público participarem ativamente.

Mas será que para os nossos deputados que se envolvem em falcatruas querem que a Justiça realmente funcione? Parece-me que para um político que rouba a nação é melhor que a reforma do Judiciário jamais saia do papel afim de que seus crimes prescrevam antes do julgamento e ele continue impune.

Até quando os maus políticos deste país continuarão transformando o nosso regime democrático numa plutocracia?! Será que nós cidadãos honestos e que sustentamos com os nossos impostos esses deputados ficaremos passivos diante de um sistema legislativo tão deturpado?

Atualmente, para que o poder seja exercido diretamente pelo povo, é preciso que sejam coletadas 1% (um por cento) das assinaturas do eleitorado nacional, em pelo menos cinco estados, nos quais, por sua vez, é preciso haver no mínimo 0,3% de adesão dos eleitores da unidade federativa. Em outras palavras, é muito difícil nas atuais condições o cidadão comum organizar-se a ponto de poder ao menos propor um projeto de lei que não sabemos nem se será aprovado.

Minha expectativa é que esta conquista da OAB beneficie também outras entidades da sociedade civil a fim de que, num futuro não muito distante, o Congresso possa reconhecer a legitimidade de todas elas para propor seus respectivos projetos de lei, conforme a pertinência do tema abordado, algo que será muito benéfico para o aperfeiçoamento da democracia brasileira.

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