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segunda-feira, 22 de dezembro de 2025

🌱 O direito à cidade começa no canteiro


Victor Graeff e as esculturas em ciprestes

Uma pequena cidade gaúcha que ganha fama por ter a “praça mais bonita” graças ao trabalho silencioso de um jardineiro octogenário. Uma escadaria carioca que se torna cartão-postal internacional pelas mãos de um artista chileno. Árvores plantadas por um saudoso morador que, décadas depois, definem a paisagem urbana inteira. O que esses casos têm em comum?

Mais do que histórias inspiradoras, eles revelam algo essencial: o direito à cidade não nasce apenas de grandes planos urbanísticos, mas também de iniciativas espontâneas, persistentes e profundamente humanas.


🌿 Iniciativas individuais que viram patrimônio coletivo

O caso retratado recentemente pela imprensa — do jardineiro de 89 anos que transformou uma praça inteira na cidade gaúcha de Victor Graeff em um conjunto de esculturas vivas — dialoga diretamente com outras experiências brasileiras e latino-americanas.

É impossível não lembrar da Escadaria Selarón, entre a Lapa e Santa Teresa, em que o chileno Jorge Selarón, morador do Rio de Janeiro, converteu um espaço degradado em símbolo cultural da cidade. Ou do famoso “Kobra”, personagem conhecido em diferentes bairros por intervenções urbanas não oficiais, que suscitam debates sobre arte, ocupação e pertencimento.

No Estado do Rio, há ainda o exemplo menos conhecido, mas não menos potente, de Tião Corrêa, responsável pelo plantio de ipês-amarelos e cerejeiras em Teresópolis — uma ação individual que moldou a identidade visual e afetiva da cidade serrana ao longo do tempo.

Esses casos mostram que o espaço público não é apenas administrado pelo Estado: ele também é produzido socialmente.


🏙️ A ponte com o direito à cidade

O conceito de direito à cidade, consagrado pelo sociólogo e filósofo francês Henri Lefebvre (1901 - 1991) e incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Estatuto da Cidade, vai muito além do acesso à moradia ou à infraestrutura. Ele envolve:


  • participação ativa dos cidadãos;
  • apropriação simbólica do espaço urbano;
  • função social da cidade e da propriedade;
  • construção coletiva do território.


Quando um morador cria e cuida de um canteiro, planta árvores ou embeleza uma praça, ele está exercendo o direito à cidade na prática, ainda que, muitas vezes, sem respaldo legal claro.

Daí surge o dilema: como o Poder Público pode reconhecer, proteger e incentivar essas iniciativas sem engessá-las ou transformá-las em mercadoria?


⚖️ A resposta institucional: um caso de Mangaratiba (RJ)

Em 2025, o município de Mangaratiba deu um passo relevante ao sancionar a Lei nº 1.589, de 11 de junho de 2025, oriunda de projeto encaminhado pelo atual Chefe do Executivo, Luiz Cláudio Ribeiro.

A lei institui o Programa de Adoção de Parques, Canteiros e Pórticos, permitindo que pessoas físicas e jurídicas participem formalmente da conservação e melhoria de espaços públicos.

Esse ponto é fundamental: o legislador não restringiu a participação a empresas, abrindo espaço para cidadãos comuns, moradores, aposentados, artistas, jardineiros e grupos comunitários.

Mais do que permitir a manutenção, a lei autoriza intervenções paisagísticas, mediante aprovação técnica, preservando o caráter de bem de uso comum do povo.


🌱 E a criação de canteiros por moradores?

Um debate central é se moradores podem criar canteiros em áreas públicas por iniciativa própria. A resposta, à luz da lei e do urbanismo democrático, é clara: sim, desde que regulamentado.

Um decreto regulamentador pode — e deve —:


  • autorizar expressamente a criação, recuperação e manutenção de canteiros;
  • prever procedimentos simplificados para pessoas físicas;
  • exigir apenas critérios mínimos ambientais e de segurança;
  • garantir que o espaço permaneça público, acessível e reversível;
  • reconhecer a iniciativa como ação cidadã, não como privatização.


Isso permite que ações hoje informais deixem de viver na fronteira da tolerância administrativa e passem a ser políticas públicas de baixo custo e alto impacto social.


🧓🌼 Trabalho ocupacional, saúde mental e pertencimento

Outro aspecto decisivo é o potencial dessas iniciativas para políticas sociais integradas. Grupos de convivência da terceira idade, usuários dos CAPS, escolas, igrejas e ONGs, por exemplo, podem encontrar no cuidado com o espaço urbano uma poderosa forma de:


  • trabalho ocupacional;
  • terapia comunitária;
  • educação ambiental;
  • fortalecimento de vínculos;
  • resgate da autoestima e do pertencimento.


Cuidar da cidade também é cuidar das pessoas!


🏷️ Reconhecer sem mercantilizar

Um dos riscos desses programas é transformar o espaço público em vitrine comercial. Por isso, boas práticas legislativas indicam:


  • placas de reconhecimento simbólico, sem publicidade;
  • certificações cidadãs;
  • cadastros públicos de iniciativas urbanas;
  • memória institucional dessas ações.


O reconhecimento deve ser cívico, não mercadológico.


🧭 Uma agenda possível para os municípios

Experiências como as de Vitória (Lei Rubem Braga), São Paulo, Rio de Janeiro e agora aqui em 2025 Mangaratiba mostram que há um caminho jurídico já aberto para reconhecer iniciativas espontâneas ligadas ao direito à cidade.

O desafio atual não é inventar do zero, mas aperfeiçoar, humanizar e democratizar esses instrumentos, garantindo que a cidade não seja apenas planejada de cima para baixo, mas também cultivada de dentro para fora.


🌻 Conclusão

Toda cidade bonita começa com um gesto simples: alguém que decide cuidar do que é de todos. Quando o poder público aprende a reconhecer esse gesto — sem sufocá-lo —, o direito à cidade deixa de ser um conceito abstrato e passa a florescer, literalmente, nos canteiros, praças e ruas.

Porque, no fim das contas, o direito à cidade também se planta.


📝 Minuta de um Projeto de Lei:

Apresento adiante um esboço completo de Projeto de Lei municipal, tecnicamente viável, politicamente defensável e explicitamente fundamentado no direito à cidade, inspirado nas referências debatidas (Mangaratiba, Rio, Vitória, São Paulo) — com foco central nas iniciativas espontâneas de cidadãos e coletivos.

O texto está estruturado para uso real por vereadores, prefeituras ou assessorias legislativas, mas também serve como referência acadêmica e militante.


📜 PROJETO DE LEI Nº ___ /2026


Ementa: Institui a Política Municipal de Valorização de Iniciativas Cidadãs no Espaço Público, como instrumento de promoção do direito à cidade, e dá outras providências. 


Art. 1º - Fica instituída a Política Municipal de Valorização de Iniciativas Cidadãs no Espaço Público, destinada a reconhecer, estimular e apoiar ações espontâneas de cidadãos e coletivos que contribuam para a melhoria, conservação, humanização e apropriação social dos espaços públicos urbanos.


Art. 2º - A Política fundamenta-se nos seguintes princípios:

I – o direito à cidade como direito coletivo;

II – a função social dos espaços públicos;

III – a participação cidadã direta na produção do espaço urbano;

IV – o pertencimento, o cuidado e a memória urbana;

V – a prevalência do interesse público sobre a apropriação privada;

VI – a simplicidade administrativa e a não burocratização.


Art. 3º - Para os fins desta Lei, consideram-se Iniciativas Cidadãs no Espaço Público as ações espontâneas, individuais ou coletivas, sem finalidade lucrativa, voltadas a:

I – criação, recuperação ou manutenção de canteiros, jardins e áreas verdes;

II – arborização urbana comunitária;

III – cuidado, limpeza leve e zeladoria cidadã;

IV – intervenções paisagísticas ou artísticas de interesse público;

V – valorização da memória, identidade e cultura locais;

VI – usos terapêuticos, educativos ou ocupacionais do espaço urbano.


Art. 4º - As iniciativas poderão ser propostas por:

I – pessoas físicas;

II – coletivos informais de moradores;

III – associações comunitárias;

IV – escolas, igrejas, ONGs e entidades sociais;

V – grupos de convivência da terceira idade;

VI – usuários e equipes vinculadas a serviços de saúde mental e assistência social.


Art. 5º ,- Poderão ser objeto das iniciativas cidadãs:

I – praças, parques e áreas verdes;

II – canteiros centrais ou laterais de vias públicas locais;

III – áreas públicas ociosas ou degradadas;

IV – entornos de equipamentos públicos;

V – outros logradouros públicos compatíveis com o uso proposto.

§1º É vedada qualquer intervenção que restrinja o livre acesso, a circulação ou a acessibilidade universal.

§2º Os espaços permanecem bens de uso comum do povo, vedada qualquer forma de privatização.


Art. 6º - O Município instituirá procedimento simplificado para reconhecimento das iniciativas, especialmente quando propostas por pessoas físicas ou coletivos informais.

§1º O procedimento exigirá, no mínimo:

I – requerimento padrão;

II – indicação do local;

III – descrição simples da ação;

IV – compromisso de respeito às normas ambientais e urbanísticas.

§2º É vedada a exigência de projeto técnico complexo, salvo em casos excepcionais devidamente justificados.


Art. 7º - O Município poderá apoiar as iniciativas por meio de:

I – orientação técnica básica;

II – fornecimento eventual de mudas ou insumos;

III – cessão temporária de ferramentas;

IV – apoio institucional e divulgação.


Art. 8º - As iniciativas reconhecidas poderão receber:

I – placa identificativa de caráter cívico, sem publicidade comercial;

II – certificado de iniciativa cidadã urbana;

III – registro em Cadastro Municipal de Iniciativas Cidadãs.


Art. 9º - As iniciativas poderão ser reconhecidas como ações complementares às políticas de:

I – saúde mental;

II – envelhecimento ativo;

III – educação ambiental;

IV – assistência social;

V – cultura e memória urbana.


Art. 10 - O reconhecimento das iniciativas:

I – não gera direito real ou posse;

II – tem caráter precário e revogável;

III – não enseja indenização;

IV – pode ser encerrado a qualquer tempo por interesse público.


Art. 11 - O Poder Executivo regulamentará esta Lei no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, podendo:

I – criar modalidades de iniciativas;

II – estabelecer critérios técnicos proporcionais;

III – instituir formulários e manuais simplificados;

IV – integrar secretarias envolvidas.


Art. 12 - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.


📌 EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS (síntese)

A presente proposição reconhece que o espaço urbano é produzido não apenas pela ação do Estado, mas também por iniciativas espontâneas, solidárias e comunitárias de cidadãos, que historicamente contribuem para o embelezamento, a conservação, a identidade cultural e a função social da cidade.

Ao instituir uma política pública voltada à valorização dessas iniciativas, o Município promove o direito à cidade, nos termos do Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257/2001), fortalece a cidadania ativa e cria instrumentos de baixo custo e alto impacto social.

O mimimi do “pé direito” e a beleza das coisas simples



✨ "Chinelas e cueiros sujos… são coisas de superior beleza em casa em que entre o sol e haja amor." – Eça de Queirós


Comecemos a tarde de hoje com um clássico português, citado hoje no site jurídico Migalhas. Porque, convenhamos, se até Eça reconhecia a beleza do cotidiano despretensioso — chinelos espalhados, fraldas sujas, risos de crianças — quem somos nós para ignorar que Havaianas podem ser muito mais do que sandálias? 🩴

O comercial com a atriz Fernanda Torres tornou-se, para alguns setores da direita, uma afronta simbólica ao “pé direito”. E assim surgiu a indignação moralista: boicotes, migração de sandálias para outras marcas e debates calorosos sobre o que é aceitável ou não. 


Fernanda Torres em campanha publicitária - Instagram

No entanto, como o meme que circula nas redes já nos ensina, a verdadeira questão não está na Havaiana em si, mas na incapacidade de enxergar o valor do afeto cotidiano.

O meme é simples, mas espirituoso: recorre a Eça, mistura literatura clássica com emojis modernos e Havaianas, e nos lembra que o cotidiano popular, cheio de pequenas imperfeições, tem sua própria beleza. 

O "mimimi" político? Deixemos de lado. A guerra cultural em torno de um trocadilho de fim de ano perde importância diante da luz do sol entrando em uma casa cheia de amor — e chinelos espalhados pelo chão. 🌞❤️

Portanto, antes de se indignar com sandálias, frisos de propaganda ou símbolos abstratos, lembremos: o valor está na vida simples, na alegria e no afeto diário, não na polêmica. Quem entende isso, sorri. Quem não entende… bem, que continue reclamando das "legítimas", como dizia o saudoso Chico Anísio. 🙄

Rio de Janeiro terá placas para marcar locais de repressão da ditadura


Busto de Rubens Paiva em frente ao antigo Doi-Codi


O Município do Rio de Janeiro sancionou a Lei nº 9.192, de 8 de dezembro de 2025, que cria o Programa Memória, Verdade e Justiça Carioca, destinado a identificar publicamente locais onde ocorreram prisões, torturas, desaparecimentos forçados e ocultação de corpos durante a ditadura civil-militar (1964–1985). A iniciativa visa preservar a memória histórica, garantir o direito à verdade e promover educação cívica sobre os abusos cometidos pelo regime militar.

O projeto teve origem no PL 437/2025, aprovado como PL 437‑A/2025, de autoria da vereadora Maíra do MST (PT), com coautoria de outros parlamentares, Mônica Benício (PSOL) e Leonel de Esquerda (PT). A proposta foi aprovada em segundo turno na Câmara Municipal com 19 votos favoráveis e 10 contrários.


Adequação legal

Especialistas destacam que a lei está em consonância com a Constituição Federal, a Constituição do Estado do Rio de Janeiro e a Lei Orgânica do município, que garantem direitos fundamentais, proteção à memória histórica e competências para legislar sobre educação e cultura.

A norma também segue as recomendações da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que orienta o Estado a preservar a memória das graves violações de direitos humanos e promover a divulgação pública da verdade sobre o período da ditadura. Além disso, a iniciativa está alinhada a tratados internacionais, como a Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado, e segue orientações do Ministério Público Federal (MPF), que recomenda políticas de memória e justiça de transição.


Locais contemplados no município

A lei abrange prédios e espaços sob jurisdição municipal, incluindo:


  • DOI-CODI/RJ – Tijuca: centro de tortura e prisão de opositores;
  • DOPS-RJ – Centro: investigação, prisão e tortura;
  • Universidades e prédios acadêmicos: repressão a estudantes e professores;
  • Prédios sindicais e industriais históricos: perseguição a líderes de trabalhadores.


Locais sob jurisdição federal ou militar, como quartéis e bases navais, não podem ser obrigatoriamente sinalizados pela lei municipal, mas poderão integrar rotas educativas e sinalizações públicas em áreas próximas, preservando a memória histórica.


Outros municípios fluminenses

A iniciativa carioca pode servir de modelo para outros municípios do estado do Rio de Janeiro, sendo que algumas cidades já estão no mesmo caminho que os vereadores cariocas:


  • Niterói: Delegacia de Polícia e quartéis usados para interrogatórios e vigilância de militantes. Lá tramita o PL 299/2025 que propõe o “Caminho da Memória, da Verdade e da Justiça”, com placas em prédios militares, DOPS, Ginásio Caio Martins e campus da UFF;
  • Petrópolis: Lá funcionou a Casa da Morte (centro clandestino de tortura e execução de militantes), um dos lugares mais conhecidos de repressão política no estado. Além de uma comissão municipal da verdade e de lei proibindo celebrações de ditaduras, é indispensável haver placas oficiais;
  • Volta Redonda: Trata-se de uma cidade industrial do setor metalúrgico (CSN) com histórico de repressão a trabalhadores e líderes sindicais onde poderiam ser realizadas ações de memória via universidades e MPF;
  • Duque de Caxias: Houve prisões e interrogatórios temporários próximo a quartéis e unidades militares estratégicas. Seria sugestiva a instalação de placas em prédios públicos, parques temáticos educativos sobre direitos humanos.
  • Angra dos Reis (e Ilha Grande): houve locais de prisão temporária, monitoramento militar e um presídio político, os quais poderiam receber placas, roteiros educativos ou centros de memória;
  • Campos dos Goytacazes: Foi polo industrial e sindical importante, com perseguição a líderes sindicais e políticos locais. Ações possíveis: Criação de rotas de memória, placas em antigos prédios administrativos ou sedes sindicais;
  • Itaboraí, São Gonçalo, Teresópolis, Cabo Frio e Macaé: Há documentos ou relatos de perseguição política e prisões temporárias nesses municípios, porém menos registro físico preservado. Seus vereadores poderiam propor placas em prédios públicos, ruas ou escolas, bem como mapas digitais de memória histórica.


Impacto da Lei

A Lei nº 9.192/2025 transforma o espaço urbano em instrumento de educação democrática e preservação da verdade histórica, garantindo que as violações cometidas durante a ditadura nunca sejam esquecidas para que nunca mais se repitam.
Mesmo limitada a prédios municipais, a iniciativa dos vereadores cariocas abre caminho para políticas semelhantes em outras cidades fluminenses, fortalecendo a memória da sociedade e o direito à verdade.


📝Nota: Em Mangaratiba, município onde o autor reside, houve vigilância de trabalhadores e transporte de presos políticos durante o regime militar. Até o momento, não existe lei municipal específica aprovada pela Câmara, porém a memória histórica poderia ser preservada via placas públicas ou exposições, bem como proibindo que pessoas que violaram direitos humanos durante a ditadura tenham seus nomes em praças, ruas, escolas e prédios públicos.

📷: Gabriel de Paiva

DIEESE: 70 anos de defesa do trabalhador e da economia brasileira



Nesta segunda-feira, 22 de dezembro de 2025, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) completa 70 anos de história

Criado em 1955, em um Brasil que se industrializava rapidamente e via crescer a urbanização, o DIEESE nasceu da necessidade urgente de informação confiável para o movimento sindical. Na época, sindicatos e trabalhadores enfrentavam salários defasados, desigualdade acentuada e ausência de dados precisos sobre condições de trabalho. A instituição surgiu, portanto, como uma ferramenta técnica e estratégica, capaz de fornecer estatísticas, estudos socioeconômicos e suporte para negociações coletivas.

Os organizadores foram dirigentes de sindicatos da indústria e do comércio, que buscavam criar uma base científica para fortalecer a atuação dos trabalhadores diante de empregadores e do governo. Ao longo das décadas, o DIEESE consolidou-se como referência nacional em análises econômicas, sociais e trabalhistas, sendo constantemente consultado por sindicatos, órgãos públicos, pesquisadores e pela imprensa.


Contribuições ao longo de sete décadas

Ao longo de 70 anos, o DIEESE construiu um legado único:


  • Décadas de 1950-60: levantamento de dados sobre salários, inflação e mercado de trabalho; produção dos primeiros relatórios técnicos.
  • Décadas de 1970-80: ampliação dos estudos para desemprego, desigualdade e condições de trabalho; maior presença junto a sindicatos de todo o país.
  • Décadas de 1990-2000: modernização com digitalização de dados, desenvolvimento de índices próprios e pesquisas nacionais mais sofisticadas.
  • Décadas de 2010-2020: atuação estratégica em políticas públicas, previdência, informalidade e debates econômicos; fortalecimento da capacitação de líderes sindicais.
  • Atualidade (2025): referência técnica reconhecida para negociações coletivas, pesquisas nacionais e regionais, e planejamento socioeconômico, consolidando-se como uma das instituições mais confiáveis do país no estudo do trabalho e da economia.


Entre suas ferramentas mais conhecidas está o cálculo do salário mínimo ideal, que não se limita ao piso oficial definido pelo governo, mas busca cobrir todas as necessidades básicas de uma família de quatro pessoas — alimentação, moradia, saúde, transporte, educação, lazer e previdência.


O salário mínimo do DIEESE: um parâmetro de dignidade

Segundo o DIEESE, o salário mínimo para 2026 deveria ser cerca de R$ 7.067, muito acima do piso oficial projetado de R$ 1.621. Esse valor reflete o mínimo necessário para que trabalhadores e suas famílias vivam com dignidade, como previsto na Constituição Federal, que garante o direito a remuneração suficiente para sustento pessoal e familiar.

Em comparação internacional, esse valor ainda ficaria abaixo do salário mínimo nominal de países como Alemanha e França, mas, considerando o poder de compra local, aproxima-se do padrão de vida observado em países desenvolvidos, permitindo acesso a bens e serviços essenciais de forma compatível com a dignidade humana.

A discrepância entre o salário mínimo oficial e o valor calculado pelo DIEESE evidencia a distância entre o mínimo legal e o mínimo necessário, mostrando que a atual política de reajustes insuficientes não garante plenamente o direito constitucional ao sustento digno.


A importância de um plano gradual

Embora o valor ideal seja elevado, especialistas apontam que um aumento abrupto poderia gerar inflação, sobrecarga de empresas e pressões fiscais, além de resistência política. Por isso, um plano gradual de aumento do salário mínimo — mesmo de 3% real ao ano — se mostra como uma alternativa equilibrada.

Simulações indicam que, com esse ritmo:


  • O poder de compra do trabalhador aumentaria visivelmente a cada década, mesmo em contextos de crise;
  • Benefícios sociais e previdenciários poderiam ser reajustados entre 50% e 100% do aumento real do mínimo, garantindo manutenção do poder aquisitivo sem sobrecarregar o orçamento;
  • Ao longo de 50 anos, o salário mínimo poderia aproximar-se do valor DIEESE, consolidando um processo de valorização contínua e previsível.


Essa estratégia permitiria uma recuperação gradual da dignidade salarial, proteção social sustentável e estímulo ao consumo, fortalecendo a economia sem provocar choques inflacionários ou desemprego massivo.


Conclusão

O DIEESE celebra sete décadas de atuação como guardião dos direitos dos trabalhadores e referência técnica da economia brasileira. Suas pesquisas, dados e estudos têm sido fundamentais para negociações coletivas, políticas públicas e debates econômicos.

O cálculo do salário mínimo do DIEESE e a discussão sobre um plano gradual de valorização ilustram como é possível conciliar direito constitucional, dignidade do trabalhador e sustentabilidade econômica, mesmo em um país marcado por desigualdade histórica.

Ao completar 70 anos, o DIEESE reafirma sua missão: promover informação, conhecimento e justiça social, mostrando que o futuro da política salarial e do trabalho digno pode ser construído com planejamento, técnica e diálogo, transformando lentamente o ideal em realidade concreta.


📷: Assembleia dos metalúrgicos em São Bernardo do Campo, 1979, a qual foi registrada por Iugo Koyama, conforme extraído de https://radiopeaobrasil.com.br/dieese-lanca-campanha-de-arrecadacao-para-projeto-sobre-seus-70-anos/

domingo, 21 de dezembro de 2025

Axé, fé e liberdade artística: um debate que pede diálogo público



Nos últimos dias, a cantora Claudia Leitte passou a ocupar o centro de um debate público que extrapola o universo artístico e alcança temas sensíveis da vida social brasileira, como liberdade religiosa, patrimônio cultural e intolerância simbólica. No dia 02 de dezembro de 2025, o Ministério Público do Estado da Bahia ajuizou uma Ação Civil Pública contra a artista, registrada sob o nº 8233054-42.2025.8.05.0001, distribuída para a 7ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador, atribuindo-lhe a prática de intolerância religiosa em razão de alterações feitas, em apresentações públicas, em letras tradicionais do axé music, especialmente aquelas que fazem referência a orixás e elementos das religiões de matriz africana.

O caso rapidamente ganhou destaque na mídia e, segundo amplamente noticiado por veículos como a Gazeta do Povo e outros portais de alcance nacional, o Ministério Público sustenta que a substituição desses termos por referências cristãs — como o uso do nome “Yeshua” em lugar de menções a Iemanjá — não se trataria de um gesto isolado, mas de uma conduta reiterada que contribuiria para o apagamento simbólico de tradições afro-brasileiras. Na ação, o MP requer não apenas indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 2 milhões, mas também o reconhecimento judicial da prática de intolerância religiosa, a imposição de obrigações de não fazer relacionadas à alteração de letras tradicionais e a adoção de medidas de caráter educativo e reparatório.

A defesa da cantora, por sua vez, sustenta que as alterações refletem suas convicções religiosas pessoais e estariam amparadas pela liberdade de expressão artística e pela liberdade de crença, ambas asseguradas pela Constituição Federal. Para esse campo de interpretação, punir ou restringir esse tipo de manifestação poderia abrir um precedente perigoso de censura, especialmente em um país plural e marcado pela diversidade religiosa.

Cumpre registrar, ainda, um aspecto processual relevante. Embora a existência da ação tenha sido amplamente divulgada e a defesa da artista já tenha se manifestado no espaço público, tais manifestações extraprocessuais não produzem efeitos jurídicos diretos no processo. Até o momento, trata-se de uma demanda em fase inicial, sem notícia de decisão judicial de mérito ou mesmo de algum despacho amplamente divulgado, o que reforça que o debate se desenvolveu socialmente antes de qualquer pronunciamento efetivo do Judiciário.

Independentemente do desfecho jurídico que venha a ter, a iniciativa do Ministério Público produziu um fato incontornável: trouxe à arena pública um debate sensível sobre cultura, religião, liberdade artística e memória social. Diante disso, talvez o maior desafio não seja apenas decidir quem tem razão no plano estritamente jurídico, mas compreender como lidar, enquanto sociedade plural, com conflitos simbólicos que atravessam identidades históricas distintas.

É inegável que o axé music não se resume a um gênero musical comercial. Ele nasce e se desenvolve profundamente conectado às tradições afro-brasileiras, às religiões de matriz africana e à história de resistência cultural de populações que, por séculos, sofreram perseguição, invisibilização e apagamento simbólico. Nesse contexto, alterações recorrentes em letras consagradas — sobretudo quando suprimem referências centrais dessa cosmovisão — podem ser percebidas, por parte significativa da sociedade, como uma forma de esvaziamento cultural, ainda que não haja intenção explícita de ofensa.

Ao mesmo tempo, não se pode ignorar que a liberdade de expressão artística e a liberdade religiosa constituem pilares do Estado Democrático de Direito. A criação artística sempre envolveu releituras, ressignificações e escolhas pessoais, inclusive motivadas por convicções de fé. Reduzir esse aspecto a uma leitura exclusivamente punitiva ou moralizante pode empobrecer o debate e gerar efeitos indesejados, como a sensação de censura ou perseguição religiosa, especialmente em um contexto social já profundamente polarizado.

É justamente nesse ponto que se abre uma alternativa mais fecunda: deslocar o centro da discussão para fora do Judiciário e dos limites estritos de um rito procedimental. O debate público, mediado por iniciativas educativas, culturais e institucionais, permite uma escuta mais ampla, menos adversarial e mais democrática. Nele, artistas, comunidades religiosas, pesquisadores, produtores culturais e o público podem expor suas percepções, dores, expectativas e limites, contribuindo para uma compreensão social mais amadurecida.

Valorizar o diálogo público não significa relativizar a importância do combate à intolerância religiosa. Ao contrário: significa reconhecê-lo como um processo pedagógico contínuo, que se fortalece quando a sociedade compreende as raízes culturais do axé, reconhece a legitimidade das tradições afro-brasileiras e, ao mesmo tempo, aprende a conviver com a diversidade de crenças e expressões individuais.

Reunir opiniões divergentes — de artistas, juristas, líderes religiosos e do público — não é sinal de fragilidade institucional, mas de vitalidade democrática. É nesse espaço de tensão criativa que o pluralismo religioso e cultural pode aprender a coexistir, não pela imposição, mas pelo reconhecimento mútuo, pelo respeito e pela educação.

Mais do que decidir um caso específico, o desafio colocado é o de formar consciências, fortalecer vínculos culturais e construir caminhos de convivência em uma sociedade diversa. E esse é um trabalho que vai muito além dos tribunais.


📷: Rovena Rosa / Agência Brasil

Verão



Inspirado no Verão de Giuseppe Arcimboldo — em que a estação aparece como rosto feito de frutos maduros —, a estação no Brasil e no Hemisfério Sul também pode ser lida como um retrato coletivo: uma soma de tempos, afetos, excessos e promessas.


Aqui, o verão começa em dezembro, quando o ano ainda pulsa com as ruas lotadas de consumidores indo às compras. É estação que não chega sozinha: vem acompanhada do encerramento do calendário escolar, das férias, das malas improvisadas, das estradas cheias, dos aeroportos lotados. O calor não é apenas climático; é social. O país desacelera em alguns setores e acelera em outros. A rotina se reorganiza.


O verão brasileiro é inseparável do Natal e do Ano Novo — datas que, sob o sol forte, ganham outro sentido. As mesas se abrem, as famílias se reúnem, mesmo entre ausências e silêncios. Há reencontros, há conflitos, há tentativas de recomeço. Entre rabanadas e frutas geladas, o ano se despede e outro se anuncia, como se o calor ajudasse a dissolver o que ficou pesado demais.


Janeiro chega com cara de promessa. Para muitos, é tempo de viagem, de praia, de pés na areia e sal na pele. Para outros, é tempo de trabalho redobrado, de cidades vazias e transporte irregular. O verão, como em Arcimboldo, é abundante — mas desigual. Enquanto uns desfrutam, outros resistem às ondas de calor, às contas altas, à falta de sombra e de água.


Fevereiro traz o retorno gradual da rotina e, com ele, o Carnaval. A estação então se torna corpo em movimento: música, rua, suor, fantasia, crítica e alegria misturadas. O verão brasileiro é também expressão cultural, ocupação do espaço público, invenção coletiva de felicidade — ainda que breve.


Em março, o verão se despede oficialmente. As aulas retornam, o calendário volta a se impor, mas o calor insiste. Ele se prolonga até abril, lembrando que os ciclos naturais nem sempre obedecem às datas formais. Como na vida, as transições são difusas.


E quando as primeiras chuvas mais constantes chegam, ecoam versos conhecidos:

São as águas de março fechando o verão…

A canção de Tom Jobim traduz o sentimento nacional: o verão não termina de forma abrupta; ele se dissolve. Leva consigo excessos, cansaços, amores rápidos, promessas não cumpridas — e deixa a expectativa de recomeço.


Assim como no quadro de Arcimboldo, o verão no Brasil é feito de múltiplos elementos: natureza, tempo, corpo, política, afeto e memória. É estação de plenitude, mas também de desgaste. De alegria e de alerta. Um rosto coletivo composto de sol, suor, música, festa e desigualdade — belo, intenso e, inevitavelmente, passageiro.

MPF Processa a União por Ataques à Memória de João Cândido: Um Marco no Direito à Memória no Brasil



No final deste ano de 2025, o Ministério Público Federal (MPF) tomou uma iniciativa sem precedentes ao ajuizar uma ação civil pública contra a União, questionando manifestações oficiais da Marinha do Brasil que, segundo o órgão ministerial, atacaram a memória histórica de João Cândido Felisberto — líder da Revolta da Chibata, um dos episódios mais emblemáticos da luta contra a violência institucional e o racismo no país.

A ação, ainda no início de seu trâmite (sem contestação apresentada até o momento), está registrada sob número 5138220-44.2025.4.02.5101 e demanda, sobretudo, a responsabilização civil da União por dano moral coletivo, com pedido de indenização de R$ 5 milhões, cujo montante deve ser aplicado exclusivamente em projetos de valorização da memória de João Cândido e de enfrentamento ao racismo estrutural.


O Caso: Do Debate Legislativo à Justiça Federal

A controvérsia teve origem em abril de 2024, quando o comandante da Marinha, em carta à Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados, tomou posição contrária à proposta de incluir João Cândido no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria – o registro simbólico das figuras que o Estado brasileiro reconhece como essenciais para sua história. Nesta carta, o militar qualificou a Revolta da Chibata como uma “deplorável página da história nacional”, atribuindo adjetivações negativas aos revoltosos.

Para o MPF, a postura oficial não se limita a uma opinião histórica: trata-se de um ato institucional que desabona um personagem já anistiado e cuja história expressa valores democráticos e de resistência contra desigualdades. Ao fazer isso, a Marinha — e por extensão o Estado — estaria violando normas constitucionais, tratados internacionais e a própria lei de anistia que restabeleceu a honra de João Cândido e seus companheiros.


Quem foi João Cândido e a Revolta da Chibata?

João Cândido Felisberto é uma das figuras mais relevantes da história do Brasil republicano. Em novembro de 1910, ele liderou a Revolta da Chibata, um movimento de marinheiros contra as práticas de punição corporal — em particular a chibata — que eram aplicadas de forma degradante, desumana e desproporcional, afetando principalmente soldados negros e pobres.

Os revoltosos tomaram o controle de navios estratégicos da Marinha na Baía de Guanabara e exigiram o fim dos castigos físicos e a melhoria das condições de trabalho; após negociações, essas exigências foram formalmente aceitas. No entanto, dias depois, muitos participantes foram presos, perseguidos e marginalizados, e João Cândido passou os anos seguintes longe de qualquer reconhecimento oficial.

Com o passar do tempo, sua luta foi sendo resgatada pela historiografia, pela cultura popular — inclusive no samba e em livros — e pelo movimento negro brasileiro. Experiências coletivas de resistência ganharam novo significado, e Cândido passou a ser visto como um símbolo de luta contra a violência institucional e de combate ao racismo estrutural.


O Direito à Memória: Um Conceito Jurídico em Jogo

O cerne da ação do MPF não se resume à discussão sobre heroísmo ou glória histórica. Trata-se de direito constitucional à memória e à preservação da dignidade histórica de agentes coletivos e individuais que contribuíram para a promoção de direitos fundamentais.

No entendimento do MPF, a manifestação oficial da Marinha deslegitima esse direito quando desqualifica um personagem cuja memória foi formalmente alçada à condição de reparação histórica pela própria lei de anistia — Lei nº 11.756/2008 — o que confere ao debate uma dimensão jurídica que ultrapassa o simples jogo de opiniões.

Além disso, a ação aponta que as declarações institucionais podem violar:


  • Princípios constitucionais relacionados à dignidade da pessoa humana e ao pluralismo de ideias;
  • Tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil;
  • Normas de proteção ao patrimônio histórico-cultural, quando o Estado se recusa a reconhecer a relevância de uma narrativa que faz parte de sua própria formação social.


Obstáculos Jurídicos à Vista

Para que o MPF alcance êxito, o processo terá de enfrentar e superar algumas questões decisivas:


1. Liberdade de expressão institucional x legalidade de atos estatais
A União poderá sustentar que uma instituição pública tem o direito de manifestar sua interpretação histórica. O desafio será demonstrar que, quando esse discurso parte de um órgão oficial e impacta a honra histórica de quem foi legalmente anistiado, ele ultrapassa a fronteira da mera opinião e se configura em dano moral coletivo.


2. Prova do nexo causal com o dano moral coletivo
O MPF terá de demonstrar que a divulgação de documentos oficiais com expressões depreciativas gerou ou pode gerar um impacto social negativo envolvendo a memória coletiva, e que esse impacto exige reparação jurídica.


3. Interpretação da lei de anistia de 2008
A defesa da memória de João Cândido se apoia não só no texto da lei, mas também no seu espírito reparador e simbólico — o que implica que a própria lei tenha efeitos interpretativos mais amplos do que uma simples declaração formal de anistia.


Implicações Políticas e Culturais

Mais do que um embate judicial, a ação do MPF insere-se em um debate mais amplo sobre quem escreve a história do Brasil e de que maneira se reconhecem as lutas coletivas por direitos. Isso tem reflexos diretos sobre a maneira como escolas, instituições públicas e a sociedade civil compreendem episódios históricos que envolvem desigualdades raciais e relações de poder.

Reconhecer ou negar a importância de figuras como João Cândido — no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria ou no imaginário coletivo — simboliza muito mais do que um título honorífico: é reconhecer que o Estado brasileiro tem a responsabilidade de enfrentar seu passado de violência e discriminação, não apenas de celebrá-lo quando conveniente.

Ao final, a ação do MPF pode abrir caminho para que o direito à memória histórica seja tratado como um direito fundamental concreto, e não como tema acessório ou meramente cultural.


📌 Nota pessoal do autor

Vale lembrar, como destacado em meu artigo do mês passado (Novembro de 1910: quando a chibata virou história), que meu bisavô, Francisco Ancora da Luz (1883 - 1951), foi contemporâneo de João Cândido, vivendo na mesma época dessas experiências dramáticas e formativas do Brasil republicano — um vínculo geracional que reforça a importância de resguardar a memória daqueles que resistiram, lutaram e ensinaram, mesmo na adversidade, sobre dignidade e direitos.


📷: Foto do Marinheiro João Cândido no Jornal Gazeta de Notícias, de 31 de dezembro de 1912. Imagem de domínio público, extraída da Wikipedia.