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domingo, 14 de dezembro de 2025

Sob o Sol de Dezembro, a Democracia caminhou em Copacabana



Hoje, milhares de brasileiros e brasileiras ocuparam de forma pacífica as ruas de dezenas de cidades em todo o país para reafirmar um princípio fundamental de toda democracia: a voz ativa do povo como força legítima de participação política. Mesmo diante do forte calor típico desta época do ano e da proximidade do período natalino — circunstâncias que poderiam desencorajar a mobilização — a presença nas ruas demonstrou compromisso com a democracia, a justiça e os valores constitucionais que regem o Brasil.


Em Copacabana, no Rio de Janeiro, a manifestação concentrou-se entre os postos 4 e 5 da orla, reunindo milhares de pessoas em um ambiente plural, pacífico e marcado pelo engajamento cívico. Movimentos sociais, sindicatos, estudantes, partidos políticos e cidadãos sem filiação partidária compartilharam o mesmo espaço público para expressar preocupação com os rumos do país e defender a responsabilização por atos que atentaram contra o Estado Democrático de Direito.


Entre as lideranças políticas presentes, destacou-se a participação do deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ), cuja fala sintetizou o espírito de resistência democrática que marcou o ato e as perseguições políticas que vem sofrendo na Câmara culminando na sua suspensão por seis meses quanto ao exercício do mandato. Em sua manifestação no Facebook, Glauber afirmou:


Eles pensaram que, com os métodos tradicionais de coação, nós ficaríamos calados. Que nos dobraríamos. Mas eles estão falando com militantes da esquerda brasileira que não se entregam.

Nos próximos 6 meses o nosso mandato não ficará sem gabinete, porque o gabinete será a praça pública, será a rua, mobilizando junto com as pessoas a luta contra a anistia dos golpistas.


A declaração reforçou a ideia de que o mandato parlamentar não se limita aos espaços institucionais, mas se projeta na rua, no diálogo direto com a população e na defesa permanente da democracia frente a retrocessos.


O ato em Copacabana também teve forte presença cultural. Convocado pelo cantor Caetano Veloso, o encontro reuniu artistas e personalidades da música e da cultura brasileira, como Gilberto Gil, Paulinho da Viola, Emicida, Lenine, Fernanda Abreu, Duda Beat, Xamã, Baco Exu do Blues e Tony Bellotto, entre outros. A participação desses nomes reforçou o papel histórico da cultura como instrumento de consciência política, resistência e mobilização social.


A pauta central das manifestações foi a crítica ao chamado PL da Dosimetria, projeto de lei recentemente aprovado pela Câmara dos Deputados e atualmente em análise no Senado Federal. Para os manifestantes, a proposta representa uma tentativa de suavizar penas e abrir brechas para a redução de punições aplicadas a condenados por crimes relacionados aos ataques antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, sendo interpretada por amplos setores da sociedade como uma forma indireta de anistia aos golpistas.


Além dessa pauta central, os atos também expressaram preocupação com:


- a defesa das instituições democráticas;

- a necessidade de transparência e responsabilidade no uso de recursos públicos;

- a rejeição a retrocessos em direitos sociais, ambientais e dos povos indígenas;

- a valorização dos direitos humanos e das liberdades civis.


Em comparação com os protestos de 21 de setembro de 2025, realizados contra a chamada PEC da Blindagem e propostas de anistia mais amplas, as manifestações deste domingo reuniram um público numericamente menor. Em setembro, Copacabana chegou a concentrar mais de 40 mil pessoas, em um contexto de forte sensação de ameaça estrutural e imediata às instituições. Ainda assim, o ato de dezembro mantém enorme relevância política: ocorreu em pleno período natalino, sob altas temperaturas, e tratou de uma pauta mais técnica — o que torna a mobilização ainda mais significativa do ponto de vista do engajamento consciente.


A repercussão nacional foi ampla, com manifestações em diversas capitais e cidades do interior, como São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Porto Alegre, Fortaleza, Recife e Salvador. A mobilização também repercutiu na imprensa internacional, que acompanha atentamente os desdobramentos legislativos e judiciais no Brasil, sobretudo no que diz respeito à responsabilização por ataques à democracia.


Quanto às expectativas em relação ao Congresso Nacional, a pressão social exerce papel fundamental no debate que agora se desloca para o Senado. A mobilização popular envia um recado claro aos parlamentares: decisões dessa magnitude não podem ser tomadas à revelia da sociedade. Ainda que existam instrumentos institucionais como veto presidencial e controle judicial, a escuta ativa da população é indispensável para a legitimidade democrática.


Por fim, é essencial reafirmar que manifestações sociais pacíficas são pilares centrais de uma democracia viva e saudável. Elas fortalecem o debate público, ampliam a participação cidadã e lembram que os direitos e garantias democráticas não são concessões, mas conquistas permanentes. A todas as pessoas que estiveram presentes hoje — enfrentando o sol forte, o cansaço e os compromissos de fim de ano — fica o reconhecimento: a democracia se constrói com presença, coragem e participação coletiva.

Quando a força tenta substituir o Direito: o caso do petroleiro venezuelano



A recente apreensão, por autoridades dos Estados Unidos, de um navio petroleiro transportando petróleo venezuelano com destino a Cuba não é apenas mais um episódio de tensão geopolítica. Trata-se de um fato grave, que lança sérias dúvidas sobre o respeito do governo Donald Trump aos fundamentos do Direito Internacional e à própria ordem multilateral construída no pós-guerra.

O episódio, amplamente noticiado pela imprensa internacional, teria ocorrido em alto-mar, com base exclusiva em sanções econômicas unilaterais impostas pelos Estados Unidos. Não houve autorização do Conselho de Segurança da ONU, tampouco consentimento do Estado da bandeira do navio. Ainda assim, Washington decidiu agir como se sua legislação interna tivesse alcance planetário.

Esse comportamento não é um detalhe técnico: ele atinge o coração do Direito do Mar. A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (UNCLOS) estabelece, de forma clara, que embarcações em alto-mar estão submetidas à jurisdição exclusiva do Estado cuja bandeira ostentam. As exceções a essa regra são taxativas — pirataria, tráfico de escravos, rádio pirata, navio sem nacionalidade — e nenhuma delas se confunde com a suposta violação de sanções unilaterais.

Quando um Estado ignora essas normas e decide apreender um navio estrangeiro com base apenas em sua própria lei, abre-se um precedente perigoso: o da substituição do Direito pela força. Se todos os países resolvessem agir da mesma forma, os mares deixariam de ser espaço de cooperação e liberdade de navegação para se tornarem território de disputas arbitrárias, regidas pela lei do mais forte.

Outro ponto central é a natureza das sanções aplicadas pelos Estados Unidos contra Venezuela e Cuba. Diferentemente das sanções impostas pelo Conselho de Segurança da ONU, essas medidas não possuem legitimidade universal. São decisões políticas internas, que não podem, à luz do Direito Internacional, produzir efeitos coercitivos automáticos sobre terceiros Estados ou sobre o comércio internacional em alto-mar.

Não por acaso, mecanismos das próprias Nações Unidas — como o Relator Especial sobre medidas coercitivas unilaterais — vêm reiteradamente alertando que esse tipo de sanção, quando aplicada de forma extraterritorial, viola princípios básicos como a soberania, a não intervenção e o direito ao desenvolvimento. No caso concreto, os impactos recaem não sobre governos abstratos, mas sobre populações civis, que dependem de energia, transporte e cooperação econômica para garantir condições mínimas de vida.

Chamar esse tipo de prática de “pirataria” pode não ser tecnicamente preciso no sentido jurídico estrito, já que a pirataria pressupõe atos privados. Mas, no plano político e moral, a expressão cumpre um papel simbólico importante: denuncia a apropriação indevida de bens alheios em alto-mar, sem respaldo no sistema jurídico internacional.

O mais preocupante é a naturalização desse comportamento. Quando uma potência global se coloca acima das regras que ajudou a construir, enfraquece-se todo o edifício do multilateralismo. Hoje é um navio venezuelano; amanhã pode ser qualquer outro país que não se alinhe aos interesses de quem detém maior poder militar e econômico.

Diante disso, cabe à comunidade internacional — e também à sociedade civil — não tratar o episódio como algo trivial. Questionar, denunciar e debater esses atos é fundamental para preservar a ideia de que as relações entre os Estados devem ser regidas pelo Direito, e não pela força. Caso contrário, abre-se caminho para um mundo em que tratados viram papel morto e a legalidade internacional se torna apenas um discurso conveniente, descartável quando deixa de servir aos interesses das grandes potências.

Defender o Direito Internacional não é defender governos específicos, mas sim proteger um mínimo de previsibilidade, justiça e equilíbrio nas relações globais. Quando esse direito é violado, todos perdem — especialmente os mais vulneráveis.

Racismo religioso no Brasil: dívida histórica e caminhos para a efetivação da imunidade tributária dos terreiros



O racismo religioso no Brasil é uma das expressões mais persistentes e invisibilizadas do racismo estrutural. Embora a Constituição Federal de 1988 consagre a liberdade religiosa e assegure a imunidade tributária aos “templos de qualquer culto”, a realidade vivida pelas religiões de matriz africana revela uma distância profunda entre o texto constitucional e sua aplicação concreta. Terreiros de Candomblé, Umbanda, Batuque, Tambor de Mina e outras tradições afro-brasileiras continuam enfrentando obstáculos burocráticos, discriminação institucional e violência simbólica e material que negam, na prática, direitos que são formalmente garantidos.


1. O racismo religioso como herança da escravidão

A perseguição às religiões de matriz africana no Brasil não é um fenômeno recente. Desde o período colonial, práticas religiosas africanas foram criminalizadas, associadas à feitiçaria, à desordem moral e à ameaça à ordem pública. O Código Penal do Império e, posteriormente, o Código Penal da República, trataram essas manifestações como crime ou contravenção. A repressão policial aos terreiros atravessou todo o século XX, mesmo após a separação formal entre Estado e Igreja.

Essa trajetória produziu efeitos duradouros. Diferentemente de igrejas cristãs, que se institucionalizaram com personalidade jurídica, registros patrimoniais e reconhecimento estatal, muitos terreiros se organizaram como espaços comunitários, familiares e ancestrais, marcados pela oralidade, pela circularidade do saber e pela resistência cultural. Essa diferença histórica é frequentemente ignorada pelo poder público, que exige dos terreiros padrões formais de documentação e organização moldados a partir de uma lógica eurocristã.


2. Racismo religioso hoje: entre a violência e a negação de direitos

Atualmente, o racismo religioso se manifesta de forma múltipla: ataques físicos a terreiros, destruição de imagens, discursos de ódio, expulsões de comunidades por grupos fundamentalistas e, de forma mais silenciosa, pela negação de direitos administrativos e tributários. Quando um município cobra IPTU de um terreiro ou nega o reconhecimento de sua imunidade tributária, não se trata apenas de um ato burocrático: trata-se de uma continuidade histórica da marginalização dessas religiões.

A Constituição é clara ao afirmar que a imunidade tributária alcança templos de qualquer culto, como instrumento de proteção à liberdade religiosa. No entanto, na prática administrativa municipal, essa garantia muitas vezes se transforma em um privilégio seletivo, acessível apenas a instituições religiosas que se enquadram em formatos tradicionais, formais e hegemônicos.


3. A dívida histórica do Estado brasileiro com os afrodescendentes

Reconhecer a imunidade tributária dos terreiros não é concessão nem favor: é parte de uma dívida histórica do Estado brasileiro com os povos afrodescendentes. As religiões de matriz africana foram fundamentais para a preservação da identidade, da memória e da resistência cultural negra diante da escravidão, do racismo e da exclusão social.

Negar direitos a esses espaços é perpetuar desigualdades históricas e reforçar a lógica de que determinadas expressões religiosas são menos legítimas do que outras. A efetivação da imunidade tributária deve ser compreendida como política de reparação institucional, em consonância com os princípios constitucionais da dignidade humana, da igualdade material e do combate ao racismo.


4. O papel estratégico dos municípios

Embora a imunidade tributária seja uma limitação constitucional ao poder de tributar, sua efetivação cotidiana passa, em grande medida, pelos municípios, especialmente no que se refere ao IPTU. Por isso, é no âmbito municipal que se concentram muitos dos entraves – e também as maiores possibilidades de transformação. Neste sentido, seguem propostas para facilitar o reconhecimento da imunidade tributária dos terreiros:


4.1. Normatização administrativa clara
Os municípios podem editar decretos, instruções normativas ou portarias que reconheçam expressamente os terreiros como templos de culto para fins tributários, evitando interpretações restritivas por parte de fiscais e secretarias de fazenda.


4.2. Procedimentos simplificados de reconhecimento
Criar processos administrativos simplificados, com exigências documentais compatíveis com a realidade dos terreiros, respeitando suas formas próprias de organização e ocupação do espaço.


4.3. Capacitação de servidores públicos
Promover formação continuada para fiscais, procuradores municipais e gestores sobre liberdade religiosa, racismo religioso e diversidade cultural, reduzindo decisões baseadas em preconceitos ou desconhecimento.


4.4. Reconhecimento autodeclaratório com presunção de boa-fé
Adotar mecanismos de autodeclaração do caráter religioso do espaço, com presunção de legitimidade, cabendo ao poder público apenas a fiscalização posterior em casos excepcionais.


4.5. Articulação intersetorial
Integrar secretarias de fazenda, cultura, direitos humanos e igualdade racial, reconhecendo os terreiros também como patrimônios culturais imateriais e espaços de proteção comunitária.


4.6. Conselhos e diálogo permanente
Instituir ou fortalecer conselhos municipais de promoção da igualdade racial e de liberdade religiosa, com participação efetiva de lideranças de matriz africana.


5. Conclusão

O combate ao racismo religioso no Brasil exige mais do que discursos genéricos sobre tolerância. Exige decisões administrativas concretas, políticas públicas afirmativas e o reconhecimento de que a neutralidade formal do Estado não pode servir de escudo para a reprodução de desigualdades históricas.

Garantir a imunidade tributária aos terreiros de religiões de matriz africana é cumprir a Constituição, promover justiça histórica e fortalecer a democracia. Enquanto esse direito continuar sendo negado ou dificultado, o Brasil seguirá em dívida com sua própria história e com milhões de cidadãos cuja fé, cultura e ancestralidade sustentaram – e ainda sustentam – a resistência contra o racismo estrutural.

Lula e as eleições de 2026: por que Tarcísio pode ser um adversário mais difícil (e ao mesmo tempo mais estável)

 


Uma recente matéria da CartaCapital sugere que o PT e Lula veem Tarcísio de Freitas como um adversário “mais fácil” do que Flávio Bolsonaro em uma possível disputa presidencial de 2026. No entanto, uma análise mais detalhada mostra que essa percepção pode não refletir a realidade eleitoral.

Do ponto de vista das pesquisas, Tarcísio apresenta menor rejeição que Flávio Bolsonaro — aproximadamente 30% a 35%, contra 50% a 55% do senador. Uma menor rejeição significa que ele tem maior potencial de conquistar eleitores moderados e centristas, além de atrair o apoio de setores empresariais e políticos que não se alinham com a base bolsonarista tradicional. Flávio, apesar do reconhecimento de nome e de sua base consolidada, enfrenta um obstáculo natural na rejeição mais alta, o que tende a favorecer Lula em cenários de segundo turno. Vale destacar que, como senador, Flávio não precisaria abrir mão do mandato para disputar a presidência, o que garante a ele um certo grau de estabilidade política pessoal, mas não altera a dinâmica eleitoral.

Essa combinação de menor rejeição e potencial de unidade da direita e do centro coloca Tarcísio em um patamar eleitoral mais competitivo do que Flávio. Cenários simulados indicam que, enquanto Lula poderia vencer Flávio com relativa margem de segurança (aproximadamente 55% a 45%), uma disputa contra Tarcísio poderia se aproximar de um empate técnico ou vitória apertada de Lula, dependendo da consolidação do apoio da oposição moderada. Ou seja, do ponto de vista estritamente eleitoral, Tarcísio não é um adversário necessariamente mais fácil — pelo contrário, sua menor rejeição e capacidade de formar alianças tornam a disputa mais equilibrada.

No entanto, é justamente essa característica moderada de Tarcísio que oferece uma vantagem significativa do ponto de vista da estabilidade política e institucional. Diferente de Flávio, que é associado a discursos mais radicais e confrontações com instituições, Tarcísio atua dentro do campo democrático, respeitando as regras eleitorais e os limites institucionais. Um segundo turno Lula x Tarcísio — mesmo equilibrado — tende a gerar menos tensão pós-eleitoral, reduzir riscos de contestação de resultados e preservar a governabilidade do país.

Portanto, a suposta “preferência” do PT por Tarcísio não se explica pela facilidade de vitória, mas sim por um cálculo estratégico que equilibra disputa eleitoral e estabilidade institucional. Lula enfrentaria um adversário mais competitivo, mas o país teria maior segurança de que o processo democrático seria respeitado, independentemente de quem vença em 2026.


📝 Nota de simulação de cenários (hipotética), realizados com a auxílio do ChatGPT

(para ilustrar os possíveis resultados em um segundo turno)


- Lula x Flávio Bolsonaro Alta (50–55%): Lula 55% – Flávio 45%. Vitória confortável de Lula, mas maior risco de radicalização da oposição

- Lula x Tarcísio (união parcial da direita/centro): Lula 52% – Tarcísio 48%  Disputa apertada, equilíbrio mais intenso

- Lula x Tarcísio (união total da direita/centro): Lula 50% – Tarcísio 50% (empate técnico). Cenário mais desafiador para Lula, porém com menor risco institucional


OBS: Tarcísio representa um adversário mais competitivo do ponto de vista eleitoral devido à menor rejeição e capacidade de formar alianças. Flávio, apesar de base sólida e mais engajada, é menos competitivo devido à rejeição alta, favorecendo a vitória de Lula. Por outro lado, a disputa contra Tarcísio é menos arriscada institucionalmente, garantindo estabilidade política e governabilidade, mesmo em um cenário apertado.

sábado, 13 de dezembro de 2025

A candidatura do vazio político?!



A tentativa de apresentar Flávio Bolsonaro como liderança nacional revela menos um projeto de país e mais um esforço de herança política. Sua pré-campanha, ao que parece, não nasce de uma trajetória marcada por ideias, propostas ou visão estratégica para o Brasil, mas da necessidade de manter viva uma marca familiar que já demonstrou seus limites e contradições quando esteve no poder.


Até aqui, Flávio Bolsonaro não apresentou um plano de governo consistente, metas claras ou diagnósticos próprios sobre os grandes desafios nacionais. Seu discurso oscila entre a promessa vaga de “dar continuidade ao projeto do pai” e movimentos defensivos para se blindar de escândalos passados. Em vez de liderar o debate público, reage a ele. Em vez de propor, recua. Em vez de convencer, tenta sobreviver politicamente.


A ausência de um projeto nacional não é detalhe: é o centro do problema. Um candidato à Presidência precisa dizer ao país o que pretende fazer com a economia, como enfrentará as desigualdades, qual será sua política ambiental, como fortalecerá as instituições democráticas e que lugar o Brasil ocupará no mundo. Flávio Bolsonaro, até o momento, limita-se a slogans ideológicos, críticas genéricas ao governo atual e à repetição de uma agenda que já foi testada — e rejeitada — nas urnas.


Sua pré-campanha também expõe insegurança política. Declarações ambíguas sobre desistir, recuos retóricos e tentativas de parecer “mais moderado” revelam um candidato que ainda busca uma identidade própria. Isso reforça a percepção de que sua candidatura não nasce de convicção ou vocação pública, mas de cálculo familiar e partidário.


Não se trata apenas de comparar estilos. Trata-se de substância. O bolsonarismo, enquanto esteve no Planalto, deixou um legado de instabilidade institucional, isolamento internacional e conflitos permanentes. Flávio Bolsonaro não apresentou nenhuma autocrítica a esse período, nem explicou o que faria de diferente. Ao contrário, se apoia nele como credencial política.


O Brasil não precisa de um herdeiro político tentando administrar um espólio ideológico. Precisa de lideranças com ideias claras, coragem para enfrentar a complexidade do país e compromisso real com a democracia, a ciência, o diálogo e as políticas públicas baseadas em evidências.

Tudo o que vivi me trouxe até aqui



Costuma-se dizer que ninguém pensa o mundo a partir do nada. A forma como enxergamos a política, o trabalho, as instituições e as pessoas é fruto de experiências acumuladas ao longo do tempo — algumas marcantes, outras aparentemente banais, mas todas formadoras.

Minha trajetória não foi linear, nem previsível. E, talvez, por isso mesmo ela tenha sido tão determinante na construção do meu olhar.

Na infância e adolescência, vivi realidades distintas. Passei por bairros urbanos da Zona Norte do Rio, como o Grajaú, experimentei a vida em cidades serranas como Petrópolis e mais tarde Nova Friburgo, e convivi com dinâmicas muito diferentes entre capital, interior e regiões de transição. Essas vivências iniciais moldaram algo fundamental: a percepção de que políticas públicas não impactam todos da mesma forma e que território, cultura e contexto importam — muito.

Já adulto, ao morar em Nova Friburgo por mais de uma década, aprofundei essa compreensão. Foi ali que participei de debates ambientais, sociais e institucionais mais estruturados, inclusive contribuindo, ainda na época da faculdade, para a formação do Comitê de Bacia do Rio Macaé, por meio da atuação na ONG Planeta Vivo. A experiência de acompanhar a construção de uma instância de governança participativa, envolvendo múltiplos municípios e interesses conflitantes, foi decisiva para entender como decisões técnicas se tornam disputas políticas e como o diálogo é, muitas vezes, o único caminho possível.

Essa visão se consolidou mais tarde com a experiência profissional em Engenheiro Paulo de Frontin, no âmbito do Consórcio de Resíduos Sólidos Centro Sul. Trabalhar em um consórcio intermunicipal é lidar, diariamente, com a complexidade do Estado real: diferentes prefeitos, prioridades divergentes, limitações orçamentárias, pressões políticas e desafios técnicos que não cabem em discursos fáceis. Ali, aprendi que boas intenções não bastam e que políticas públicas exigem articulação, método e persistência.

Outras experiências também ampliaram meu horizonte. Morar por um período em Juiz de Fora, em outro estado, permitiu observar uma cultura política distinta da fluminense e compreender melhor como decisões estaduais e federais reverberam de formas diversas pelo país. Ter familiares vivendo em Brasília reforçou uma percepção importante: aquilo que é decidido nos grandes centros de poder nunca é abstrato. Afeta vidas concretas, famílias, territórios e histórias.

Hoje, vivendo em Mangaratiba, mais especificamente em Muriqui, todas essas experiências fazem sentido em conjunto. Elas não me afastaram do território; ao contrário, ajudaram a enxergá-lo com mais profundidade. Entender o Estado como sistema, as regiões como partes interdependentes e a política como processo — e não como evento isolado — é resultado direto desse caminho percorrido.

Não acredito em visões prontas nem em soluções mágicas. Acredito em aprendizado contínuo, em escuta e em responsabilidade. Tudo o que vivi me trouxe até aqui não como ponto de chegada, mas como ponto de consciência: a certeza de que pensar o futuro exige memória, experiência e disposição para compreender a complexidade do presente.

E é a partir desse acúmulo — humano, profissional e político — que sigo refletindo, trabalhando e dialogando sobre os rumos que escolhemos enquanto sociedade.


OBS: Imagem acima extraída de https://secure.avaaz.org/po/petition/INEARJ_MMA_MPRJ_ALERJ_PMNF_APAEMCCBHMacae_PMNF_PMM_PMCA_Nao_autorizem_a_instalacao_de_hidreletricas_no_Rio_Macae/?sXndGeb

📜 Mensagem de Parabéns ao Ministro Alexandre de Moraes



Hoje, 13 de dezembro, celebramos a data natalícia de um dos nomes mais proeminentes do cenário jurídico brasileiro contemporâneo: o Ministro Alexandre de Moraes, nosso querido Xandão. 


Nesta ocasião tão significativa, é com profundo respeito e reconhecimento que prestamos homenagem à sua trajetória de dedicação ao Direito, à Justiça e ao Estado Democrático de Direito.


Formado em Direito pela renomada Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, onde também conquistou o doutorado em Direito do Estado e a livre-docência em Direito Constitucional, o ministro construiu uma carreira acadêmica e profissional marcada pela excelência e pela paixão pelo estudo jurídico. 


No campo acadêmico, além de sua atuação como professor titular de Direito Eleitoral e constitucional, contribuiu significativamente para o pensamento jurídico brasileiro, influenciando gerações de juristas e estudantes. Inclusive eu mesmo estudei Direito Constitucional através de uma das edições de seu livro.


Na esfera pública, sua atuação começou como promotor de Justiça em São Paulo, passando por importantes cargos administrativos e culminando, em 22 de março de 2017, com sua nomeação ao Supremo Tribunal Federal (STF). Posteriormente, foi também presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no biênio 2022-2024, assumindo responsabilidades cruciais na condução e supervisão das eleições brasileiras. 


Além de magistrado e professor, o ministro tem se destacado como autor e estudioso da literatura jurídica. Sua obra “Democracia e Redes Sociais: o Desafio de Combater o Populismo Digital Extremista” foi finalista do Prêmio Jabuti Acadêmico, evidenciando não apenas seu conhecimento técnico, mas também sua reflexão profunda sobre os desafios que as novas mídias representam para a democracia no século XXI. 


No exercício de suas funções no STF, Alexandre de Moraes tem sido uma figura central na preservação das instituições democráticas brasileiras. Sua atuação em temas que tocam o núcleo do Estado Democrático de Direito — como a condução de importantes investigações sobre ataques antidemocráticos e a regulação de fenômenos associados à desinformação — tem gerado amplo debate público e acadêmico, reafirmando a importância de um Judiciário comprometido com a Constituição. 


Independentemente das controvérsias que cercam algumas de suas decisões — o que é parte natural de qualquer democracia madura — é inegável que o ministro tem sido uma presença influente nas discussões sobre os limites e as responsabilidades do Poder Judiciário em momentos de forte polarização política e institucional. Sua trajetória reflete não apenas um percurso profissional de grande responsabilidade, mas também um empenho contínuo na reflexão sobre as regras que sustentam nossa convivência cívica. 


Portanto, neste dia especial, desejo ao ministro Alexandre de Moraes um feliz aniversário, com reconhecimento pela sua contribuição ao direito brasileiro, à academia e à proteção da ordem constitucional. Que ele continue sendo inspiração para o diálogo jurídico e para o fortalecimento das instituições democráticas no Brasil.


🎉 Parabéns, Xandão!

Narrativas que ignoram a realidade: o custo político da fantasia bolsonarista



A política exige leitura da realidade, compreensão das instituições e respeito aos limites do possível. Quando narrativas passam a substituir fatos, o resultado não é mobilização consciente, mas frustração coletiva. Nos últimos anos, o bolsonarismo tem sido um exemplo recorrente desse fenômeno: a construção de expectativas irreais, repetidas à exaustão, até que colidam com a realidade — quase sempre de forma ruidosa.


Após as eleições de 2022, parte expressiva da base bolsonarista passou a acreditar que as Forças Armadas interviriam para reverter o resultado das urnas. Ignorou-se deliberadamente a Constituição, o papel institucional dos militares e o próprio histórico republicano do país. A promessa velada de uma “solução de força” funcionou como combustível emocional, mas nunca teve sustentação jurídica ou política. O desfecho foi previsível: não houve intervenção, apenas frustração e radicalização de uma parcela dos seguidores.


O mesmo roteiro se repetiu recentemente na política internacional. Criou-se a ilusão de que Donald Trump, uma vez no poder, atuaria como uma espécie de tutor ideológico da extrema direita brasileira, usando instrumentos como a Lei Magnitsky para atacar instituições e autoridades do país. Mais uma vez, a realidade impôs seus limites. Os Estados Unidos operam com base em interesses estratégicos e comerciais, não em fidelidades pessoais ou cruzadas ideológicas importadas. O recuo de Trump expôs o óbvio: não há alinhamento automático, muito menos disposição para comprar disputas internas do Brasil.


Essas narrativas não são erros inocentes. Elas cumprem uma função política clara: manter a base mobilizada, transferir responsabilidades e alimentar a ideia permanente de que uma força externa — militares, potências estrangeiras, líderes messiânicos — resolverá conflitos que só podem ser enfrentados no terreno democrático. É uma forma de terceirizar a política e fugir do debate real.


O problema é que a fantasia tem custo. Cada expectativa inflada que se desfaz corrói a credibilidade das lideranças que a promoveram. Cada promessa impossível reforça a desconfiança nas instituições e aprofunda a desconexão entre discurso e realidade. No fim, sobra um eleitorado frustrado, radicalizado e cada vez mais distante da política concreta.


A democracia não se sustenta em mitos, salvadores ou atalhos. Ela exige maturidade, responsabilidade e compromisso com os fatos — mesmo quando eles contrariam desejos e crenças. Enquanto o bolsonarismo insistir em construir sua força sobre narrativas desconectadas da realidade, continuará condenado a tropeçar nos próprios delírios. E o preço dessa insistência não é apenas político: é institucional, social e democrático.

🗳️ O que muda com a decisão do TRE e como uma possível revisão do eleitorado pode impactar as eleições de 2028 em Mangaratiba



Nos últimos dias, o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) tomou uma decisão relevante sobre a situação do eleitorado de Mangaratiba. O Corregedor Regional determinou a retomada do processo que analisa possíveis distorções no cadastro de eleitores do município e autorizou novas diligências técnicas.

A decisão não decreta ainda a revisão do eleitorado, mas reconhece que existem indícios suficientes para que o tema seja analisado com profundidade. Caso essa revisão venha a ocorrer, os efeitos poderão ser sentidos diretamente nas eleições municipais de 2028.

Mas, afinal, o que isso significa na prática?


📌 O que é a revisão do eleitorado?

A revisão do eleitorado é um procedimento administrativo conduzido pela Justiça Eleitoral com o objetivo de:


  • atualizar o cadastro de eleitores;
  • verificar se os eleitores realmente possuem vínculo com o município;
  • corrigir transferências irregulares;
  • cancelar títulos inconsistentes;
  • ampliar e conferir a biometria.


É importante destacar que a revisão não é punição, não acusa candidatos, partidos ou eleitores específicos e não depende de condenações judiciais. Seu objetivo é garantir eleições mais justas e representativas.


📌 Por que Mangaratiba está sendo analisada?

Mangaratiba apresenta uma situação que chama a atenção dos órgãos eleitorais:


  • o município possui mais eleitores do que habitantes, segundo dados oficiais;
  • houve crescimento acelerado do eleitorado em curto período;
  • surgiram registros de endereços com dezenas de eleitores cadastrados e consumo zero de energia elétrica, conforme dados técnicos.


Esses fatores não significam, automaticamente, que houve fraude, mas são indícios de distorção do cadastro, o que justifica uma análise aprofundada da Justiça Eleitoral.


⚖️ O que decidiu o Corregedor do TRE?

Na decisão recente, o Corregedor Regional:


  • determinou a retomada do processo iniciado anos atrás;
  • reconheceu a existência de indícios técnicos relevantes;
  • solicitou novos levantamentos e cruzamentos de dados;
  • deixou claro que a eventual revisão não depende do resultado de ações judiciais eleitorais (AIJE) nem de inquéritos policiais.


Em outras palavras, mesmo que não haja condenações, a revisão pode ocorrer se os dados apontarem inconsistências estruturais.


📆 Por que 2027 é um ano-chave?

A legislação eleitoral proíbe revisão do eleitorado em ano de eleição. Por isso:


  • 2026 → ano eleitoral (eleições gerais);
  • 2027 → único ano possível para realizar a revisão;
  • 2028 → eleições municipais.


Se a revisão for autorizada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ela deverá ocorrer em 2027, produzindo efeitos diretos no pleito municipal seguinte.


🧮 Como a revisão pode mudar a eleição de vereadores em 2028?

As eleições para vereador seguem o sistema proporcional, no qual os partidos precisam atingir um número mínimo de votos — o chamado quociente eleitoral — para conquistar vagas na Câmara.

Com um eleitorado inflado, esse número tende a ser mais alto.
Com a revisão, o eleitorado pode diminuir — e o quociente também.


🔢 Simulação realista para Mangaratiba (13 vagas)

Considerando cenários possíveis após uma revisão do eleitorado, o quociente eleitoral em 2028 pode girar em torno de:


  • Cenário conservador: cerca de 2.400 votos
  • Cenário provável: cerca de 2.250 votos
  • Cenário mais intenso: cerca de 2.100 votos


Na prática, isso significa:


  • partidos com 1.700 a 1.900 votos já entram na disputa por vaga por média;
  • com 2.100 a 2.400 votos, a eleição de 1 vereador se torna bastante provável;
  • com algo entre 4.200 e 4.800 votos, um partido pode eleger 2 vereadores.


🏘️ Quem ganha com a revisão do eleitorado?

Ganha principalmente:


  • o eleitor que realmente mora em Mangaratiba;
  • os candidatos com base comunitária e atuação local;
  • partidos organizados, com nominatas equilibradas;
  • a representatividade política do município.


A revisão corrige distorções e faz com que o voto do morador local volte a ter o peso justo.


⚠️ Quem tende a perder espaço?


  • estruturas artificiais de campanha;
  • legendas criadas apenas para inflar votação;
  • candidaturas sem vínculo real com a cidade;
  • estratégias baseadas em distorções do cadastro eleitoral.


A revisão não favorece nomes específicos, mas fortalece quem disputa dentro das regras.


🧠 Conclusão

A decisão do Corregedor do TRE é técnica, administrativa e preventiva. Ela não antecipa culpados, mas reconhece que Mangaratiba precisa de uma análise séria e responsável de seu eleitorado.

Se a revisão ocorrer em 2027, a eleição municipal de 2028 tende a ser:


  • mais justa,
  • mais equilibrada,
  • mais representativa,
  • mais aberta a candidatos verdadeiramente ligados à cidade.


Em resumo, rolando a revisão em 2027, teremos menos distorções, mais democracia.

Mangaratiba tem agora a oportunidade de chegar a 2028 com um cadastro eleitoral que reflita, de fato, quem vive e participa da vida do município.

🔥 O RIO VAI TOMAR AS RUAS. E NÃO VAI SER EM SILÊNCIO. 🔥



Amanhã, 14/12, é dia de ocupar Copacabana e dizer, em alto e bom som: CHEGA!

Chega de um Congresso distante do povo, capturado por interesses privados e desconectado da vontade popular.


📢 VAMOS DEVOLVER O CONGRESSO AO POVO!

Não é slogan vazio. É exigência democrática. O Brasil não pode continuar refém do orçamento secreto, das barganhas de bastidores e de quem legisla contra a maioria da população.


🎶 A cultura também é resistência.

Artistas que fizeram e fazem a história do Brasil se juntam ao povo porque sabem: quando a democracia é atacada, a arte responde, a rua responde, o povo responde.


Este ato é do povo, não de gabinetes.

É de quem trabalha, de quem sonha, de quem acredita que democracia não se negocia. Quem ama o Brasil não se esconde — vai pra rua.


📍 Copacabana – Posto 5

🕑 14h | 14/12


👉 Traga sua voz.

👉 Traga sua bandeira.

👉 Traga sua indignação.



RESPEITEM O BRASIL.

O RIO ESTARÁ NAS RUAS.

A redução da jornada de trabalho e o legado de um senador comprometido com a dignidade humana

 


A aprovação da PEC 148/2015 na Comissão de Constituição e Justiça do Senado representa um marco relevante no debate sobre o futuro do trabalho no Brasil. Trata-se de uma iniciativa que não surge do acaso, mas do acúmulo histórico de lutas sociais, de amadurecimento institucional e, sobretudo, do compromisso de parlamentares que jamais se afastaram da defesa da dignidade da classe trabalhadora.

Nesse cenário, é digno de reconhecimento o papel do deputado que, de forma coerente e firme, tem se posicionado publicamente em defesa da redução da jornada de trabalho, do enfrentamento à exaustiva escala 6x1 e da valorização do tempo de vida do trabalhador. Em um ambiente político frequentemente marcado pelo oportunismo e pela indiferença social, sua atuação reafirma que ainda existem representantes comprometidos com um projeto de país mais humano, justo e socialmente responsável.

A PEC 148/2015, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), propõe a redução gradual da jornada semanal de trabalho de 44 para 36 horas, sem redução salarial. O texto estabelece uma transição responsável e progressiva: inicialmente, a jornada é reduzida para 40 horas semanais e, nos anos seguintes, diminui-se uma hora por ano até alcançar o patamar de 36 horas. Trata-se de uma mudança estrutural, alinhada às transformações do mundo do trabalho, aos avanços tecnológicos e à necessidade de conciliar produtividade com saúde, convívio familiar e participação cidadã.

Mais do que um debate meramente econômico, essa proposta expressa uma verdadeira agenda de humanização do trabalho. Reduzir a jornada não significa produzir menos, mas produzir com mais qualidade, menos adoecimento físico e mental e maior equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. É reconhecer que o desenvolvimento não pode ser medido apenas por índices financeiros, mas também pelo bem-estar das pessoas.

A relevância dessa PEC também se explica pelo legado do senador Paulo Paim, que se despede da vida pública como uma das mais consistentes referências na defesa dos direitos humanos e sociais no Parlamento brasileiro. Sua trajetória é marcada pela coerência, pela escuta dos movimentos sociais e pela construção de normas jurídicas que transformaram realidades.

Entre as principais leis de sua autoria ou protagonismo legislativo destacam-se o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – LBI (Lei nº 13.146/2015), a Lei de Cotas para Pessoas com Deficiência no mercado de trabalho (Lei nº 8.213/1991), além de relevantes iniciativas no combate à discriminação, na proteção previdenciária e na valorização do trabalho. São marcos legais que expressam um mesmo eixo: colocar a dignidade humana no centro da ordem jurídica.

Ao encerrar sua trajetória parlamentar, o senador Paulo Paim deixa mais do que projetos aprovados. Deixa um legado ético, social e jurídico que continuará orientando o debate público e inspirando novas gerações de parlamentares. A PEC 148/2015 é a síntese desse percurso: uma proposta que reconhece o trabalhador não apenas como força produtiva, mas como ser humano pleno de direitos.

Valorizar essa iniciativa, reconhecer o legado do senador e apoiar parlamentares que seguem essa mesma trilha — como o deputado que hoje defende essa bandeira — é reafirmar que o Brasil precisa avançar não apenas em indicadores econômicos, mas em humanidade, justiça social e dignidade no trabalho.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2025

Entre a moenda e o bosque: reflexões sobre 2026



Há uma frase do abolicionista Joaquim Nabuco com a qual muito me identifico:


A política é uma moenda: entrado o braço, vai-se todo o corpo.


Nabuco falava da força irresistível com que a vida pública absorve aqueles que, mesmo querendo viver apenas das ideias, acabam sendo puxados pela necessidade interior de agir diante das circunstâncias.

Com o tempo, percebi que essa frase também se cruza com outra imagem clássica da literatura antiga: o apólogo de Jotão, em que as árvores do bosque procuram alguém para governá-las... A oliveira, a figueira e a videira — todas produtivas, úteis e virtuosas — recusam o cargo, cada uma preferindo seguir sua própria função. No fim, quem aceita reinar é o espinheiro, a planta sem fruto e sem sombra, que ameaça queimar quem não se curvar diante dela.

Muito além de qualquer leitura religiosa, o apólogo é uma metáfora política poderosa: quando os que têm algo a oferecer se afastam, o espaço fica livre para quem nada entrega.

E assim, entre a moenda de Nabuco e o bosque de Jotão, fui reconhecendo partes da minha própria história. Entrei na política ainda adolescente, no movimento estudantil de Juiz de Fora, e depois caminhei pela serra de Nova Friburgo, pela defesa ambiental, pelos direitos coletivos, pelas causas das pessoas com deficiência, pelos movimentos anticorrupção, pelas lutas sindicais e pela transparência institucional.

Desde 2012, a Costa Verde se tornou também parte fundamental da minha vida. Em Mangaratiba, ajudei a criar a ONG Mangaratiba Cidade Transparente, atuei em pautas de cidadania, acompanhei processos de revisão do eleitorado e mantive uma prática constante de defesa da legalidade e da participação social. Ao longo de três décadas, passei por blogues, artigos na imprensa, ações populares, denúncias, debates jurídicos e tantas outras frentes que acabaram somando uma identidade política construída no trabalho diário e não em gabinetes.

Olho para trás e vejo que não entrei inteiro na política — entrei pelo braço. Mas as circunstâncias, as urgências e as ausências de muitos fizeram com que eu fosse, pouco a pouco, entrando por completo. Não por ambição, mas por responsabilidade: cada vez que as boas árvores se afastam, o espinheiro encontra terreno fértil.

É por isso que hoje compartilho algo que venho amadurecendo há algum tempo: meu projeto pessoal de vida para 2026 inclui a intenção de apresentar meu nome como pré-candidato a deputado estadual.

Não se trata de campanha, nem de pedido de voto — isso é algo que a lei não permite e que respeito integralmente. Trata-se apenas de dividir com a sociedade um caminho que se tornou natural diante da minha trajetória e do momento histórico que vivemos.

Ainda não é hora de discutir articulações ou alianças. Isso virá com serenidade e diálogo. Mas é, sim, o momento de dizer que estou disposto a continuar contribuindo para um Rio de Janeiro mais democrático, mais transparente e mais comprometido com o interesse público.

Entre a moenda que não permite a neutralidade e o bosque que não pode ser entregue ao espinheiro, sigo construindo, com humildade, a possibilidade de dar um próximo passo.

Se será este o caminho certo, o tempo dirá. Mas é assim que escolho seguir: com coerência, responsabilidade e o desejo sincero de servir à sociedade do meu estado.

O falso patriotismo do PL e a rejeição do Tratado de Proibição de Armas Nucleares



A Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CREDN) da Câmara dos Deputados rejeitou o Tratado sobre a Proibição de Armas Nucleares (TPAN), assinado pelo Brasil em 2017, durante o governo de Michel Temer. A decisão, liderada pelo relator, deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP), e aprovada por votação simbólica, coloca em evidência mais do que uma questão jurídica: evidencia uma estratégia política clara de construção de narrativa em torno do chamado “patriotismo”.


O que o TPAN representa e por que a rejeição não altera nada?

O TPAN é um tratado internacional que visa proibir o uso, desenvolvimento e posse de armas nucleares. Para o Brasil, que já é signatário do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP) e possui legislação interna que proíbe qualquer programa nuclear bélico, o novo tratado não altera em nada a capacidade de defesa do país nem a sua soberania real. Em outras palavras, a rejeição aprovada pela CREDN não transforma juridicamente o Brasil em um país mais “patriótico” ou mais “independente” — trata-se de uma decisão puramente simbólica.

O voto do relator foi explícito nesse sentido: ele recomendou a rejeição do TPAN, alegando que o tratado seria ineficaz, especialmente porque nenhuma potência nuclear havia assinado o documento. No entanto, do ponto de vista legal e técnico, o Brasil continua impedido de produzir ou usar armas nucleares, independentemente da rejeição do tratado.


A dimensão política e simbólica?

É nesse contexto que se percebe o que pode ser chamado de “falso patriotismo”. O PL, partido que historicamente já buscou construir uma narrativa nacionalista e ligada à soberania, parece usar a rejeição do TPAN como ferramenta de posicionamento político. Ao se colocar contra o tratado, o partido cria uma narrativa de defesa da soberania e das Forças Armadas, mesmo que não haja impacto real na política de defesa do país.

Paralelamente, a oposição direta ao governo Lula, que desde o início de seu mandato tem resgatado símbolos de soberania e reforçado a política externa brasileira em acordos multilaterais, reforça o caráter instrumental dessa decisão. O PL, ao se apresentar como defensor de um “Brasil forte e soberano”, tenta recuperar o discurso de patriotismo, que atualmente tem sido associado à imagem do presidente Lula no cenário nacional.


Evidências de que o patriotismo do PL é instrumental?

Alguns sinais deixam claro que a narrativa do partido é mais performativa do que substantiva:


  1. Rejeição de um tratado que não altera a capacidade nuclear do Brasil – o que mostra que a ação é simbólica e não técnica.
  2. Registro de membros do PL defendendo posições radicais, incluindo a admiração por figuras internacionais como Donald Trump ou até a ideia de intervenções externas, reforçando um discurso de oposição extrema.
  3. Uso das redes sociais e da visibilidade parlamentar para reforçar a narrativa de “defesa da soberania nacional”, sem que isso se traduza em mudanças concretas na política de defesa.


Mesmo deputados do PT, como Arlindo Chinaglia e Carlos Zarattini, que atuaram para aprofundar o debate sobre o TPAN e manifestaram posições favoráveis à ratificação, ficaram à margem da decisão simbólica aprovada pela comissão.


Conclusão: uma narrativa performativa

A rejeição do TPAN pelo PL e seus aliados não fortalece a soberania do Brasil. Ao contrário, serve como um instrumento de construção de identidade política, com claro objetivo de criar contraste com o governo Lula e resgatar a narrativa de patriotismo que antes parecia monopolizada pela oposição. Trata-se de uma estratégia de patriotismo de fachada, voltada mais para mobilizar bases eleitorais e reforçar a imagem do partido do que para qualquer resultado prático ou soberano no plano nacional ou internacional.

Em última análise, o episódio evidencia a crescente politização de temas de segurança nacional no Brasil, em que discursos de “defesa da pátria” podem ser utilizados como ferramenta de marketing político, desvinculada da realidade jurídica e estratégica do país. O debate sobre soberania, neste caso, mostra-se menos sobre defesa efetiva e mais sobre performatividade política, em um momento em que o PL busca reposicionar sua identidade simbólica e eleitoral no cenário nacional.

Santa Catarina e o retrocesso nas políticas de inclusão: a aprovação do PL 753/2025 e o futuro das cotas raciais


Jeferson Baldo/Agência AL


Nesta semana, a Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc) aprovou o Projeto de Lei nº 753/2025, de autoria do deputado estadual Alex Brasil (PL), que estabelece a proibição da adoção de cotas raciais e outras ações afirmativas nas universidades estaduais e nas instituições que recebem verbas públicas do estado. A proposição, alinhada a uma agenda conservadora que tem ganhado força na política catarinense, segue agora para sanção do governador Jorginho Mello (PL).


O que diz o PL 753/2025?

Embora o texto aprovado não cite literalmente “cotas raciais”, ele omite esse critério das reservas de vagas que permanecem autorizadas, resultando na vedação prática dessas políticas. A proposta permite apenas três categorias de reserva de vagas:


  • pessoas com deficiência (PCD);
  • critérios exclusivamente econômicos (renda);
  • estudantes oriundos de instituições estaduais públicas de ensino médio.


O projeto Legislativo também impõe multas pesadas de R$ 100 mil por edital que descumprir a proibição e prevê a possibilidade de corte ou suspensão de verbas públicas às instituições que adotarem critérios vedados.

Esse conjunto de dispositivos configura um ataque direto às políticas de inclusão que vinham sendo implantadas em ambientes universitários, especialmente nas universidades estaduais como a Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc).


Como foi a tramitação?

O PL 753/2025 foi aprovado em sessão da Alesc realizada em 10 de dezembro de 2025, por maioria de votos, em uma votação simbólica — ou seja, sem registro nominal no painel eletrônico, ainda que a mesa diretora tenha citado os parlamentares contrários.

Sete deputados se posicionaram contra a proposta, entre eles Fabiano da Luz (PT), Padre Pedro Baldissera (PT), Neodi Saretta (PT), Marquito (PSOL), Dr. Vicente Caropreso (PSDB), Paulinha (Podemos) e Rodrigo Minotto (PDT).


Críticas políticas: retrocesso ou avanço?

Para os defensores da proposta, o argumento central é que as cotas baseadas em critérios raciais colidiriam com princípios jurídicos como a isonomia e impessoalidade, e que apenas critérios socioeconômicos deveriam ser considerados para a reserva de vagas.

No entanto, corretamente a oposição classifica o projeto como retrógrado, discriminatório e um retrocesso nas políticas públicas de inclusão. O deputado Fabiano da Luz, um dos principais críticos, declarou que a iniciativa “envergonha Santa Catarina” e que as cotas não são privilégios, mas instrumentos de correção de desigualdades históricas profundamente estruturadas na sociedade brasileira. Ele anunciou que o projeto será alvo de ação judicial assim que for sancionado, por considerar que a proposta viola princípios constitucionais e objetivos fundamentais da República, como a redução das desigualdades sociais.

Além do setor político, universidades e institutos federais, como UFSC, UFFS, IFSC, IFC e a própria Udesc, emitiram notas de repúdio à aprovação do projeto, destacando que a medida ignora evidências acadêmicas sobre a importância das políticas afirmativas e representa um ataque às práticas democráticas e de promoção da diversidade no ambiente educacional.


Por que a norma entra em choque com a legislação federal e o STF?

As ações afirmativas, incluindo as cotas raciais, são reconhecidas e regulamentadas em nível federal — como na Lei nº 12.711/2012 (Lei de Cotas), que estabelece reservas de vagas com critérios sociais e raciais para universidades federais — e já foram reiteradamente validadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como compatíveis com a Constituição. O STF considerou que tais políticas são compatíveis com o princípio da igualdade material, um dos pilares do texto constitucional, justamente por sua capacidade de corrigir desigualdades históricas.

A proibição em Santa Catarina, portanto, cria um proposital conflito normativo e constitucional, na medida em que restringe instrumentos de inclusão que são legitimados por norma federal e por entendimentos consagrados pelo STF. Há também a questão da autonomia universitária, prevista constitucionalmente, que garante às instituições de ensino superior a capacidade de definir seus critérios de ingresso e políticas acadêmicas.

Especialistas em direito constitucional e movimentos sociais apontam que o PL pode ser considerado inconstitucional por violar os princípios da igualdade material, da dignidade humana, dos objetivos fundamentais da República (como a redução das desigualdades) e por invadir áreas de competência legislativa da União.


Impactos práticos sobre direitos educacionais

Caso sancionado, o PL 753/2025 terá efeitos concretos sobre o acesso à educação superior no estado. As políticas de ação afirmativa estão historicamente associadas a ganhos de diversidade e inclusão no ensino, beneficiando estudantes de grupos racialmente discriminados que, de outra forma, encontram barreiras quase intransponíveis para ingressar nas universidades. Estudos acadêmicos identificam que essas políticas ampliam o acesso e melhoram resultados socioeconômicos para os beneficiários ao longo de suas trajetórias profissionais e de vida.

Eliminar ou restringir cotas raciais em instituições estaduais coloca em risco décadas de avanços na democratização do ensino superior e pode gerar exclusão adicional de estudantes marginalizados, além de enfraquecer a missão pública de assegurar igualdade de oportunidades no acesso à educação.


Caminhos de resistência: o que a sociedade civil e a oposição podem fazer?

Diante do iminente risco de sanção do governador e da promulgação futura da lei, a sociedade civil organizada, partidos de oposição, movimentos estudantis, sindicatos e entidades de direitos humanos têm diversas frentes de ação possíveis:


1. Mobilização jurídica

  • Ajuizamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ou Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no STF, questionando a compatibilidade da lei com a Constituição, a legislação federal e a jurisprudência consolidada do Supremo sobre ações afirmativas e autonomia universitária.


2. Ações no âmbito estadual

  • Mandados de segurança ou ações civis públicas no Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) para barrar a aplicação imediata da lei em situações concretas, caso ela entre em vigor.


3. Organização popular e debate público

  • Campanhas educativas e audiências públicas para ampliar o entendimento da população sobre a importância das políticas de inclusão e os efeitos negativos da lei, fortalecendo o debate democrático.


4. Resistência institucional

  • Manifestação de reitores, professores e estudantes, como já ocorrido com notas públicas, ampliando a pressão sobre o governo e a opinião pública.


5. Ações parlamentares

  • Obstrução legislativa e recursos na própria Alesc ou na esfera federal para pressionar pela revogação ou modificação da lei.


Conclusão

A aprovação do PL 753/2025 representa um ponto crítico na política educacional de Santa Catarina, marcado por um movimento político que busca limitar políticas de inclusão e retroceder em direitos adquiridos por meio de lutas históricas. Sua possível sanção significaria institucionalizar um retrocesso que, além de ferir princípios constitucionais e gerar conflitos jurídicos, ameaça concretamente o direito à educação equitativa e igualitária num estado de enorme desigualdade racial e social.

A resposta da sociedade civil e dos setores progressistas será decisiva para defender a inclusão, a justiça social e os princípios democráticos, utilizando todos os instrumentos legais e políticos disponíveis para impedir a aplicação de uma lei que — se sancionada — pode escrever um dos capítulos mais controversos da história legislativa catarinense.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

Como a mobilização virou o jogo: a batalha contra a cassação de Glauber



A votação realizada na Câmara dos Deputados em 10 de dezembro de 2025 sobre o deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) trouxe à tona não apenas a decisão sobre o mandato de um parlamentar, mas também múltiplas reflexões sobre o funcionamento do regime democrático e do próprio Parlamento brasileiro.


O resultado da votação e seus impactos

Na votação do Plenário, a Câmara aprovou a suspensão de seis meses do mandato de Glauber Braga, substituindo a cassação defendida pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar. A suspensão foi aprovada por 318 votos a 141, e houve três abstenções. Com isso, Glauber Braga não perdeu o mandato e, consequentemente, não ficou inelegível por oito anos, o que abriria a possibilidade de disputar eleições futuras — incluindo, por exemplo, pleitos estaduais como o de governador do Rio de Janeiro.

Esse desfecho coloca em perspectiva uma questão fundamental: a cassação e a inelegibilidade não são resultados automáticos em processos que tratam de suposta quebra de decoro parlamentar. A decisão do Plenário ao optar por suspensão — e não cassação — mostra que há espaço para dosimetria da pena e consideração de variáveis políticas e institucionais, sobretudo quando há forte mobilização política e apoio popular.


Contradições e tensões dentro do Parlamento

O episódio também expôs contradições e tensões no comportamento institucional da Casa. No dia anterior à votação, Glauber Braga ocupou a cadeira da presidência da Câmara como ato de protesto contra a inclusão de seu nome na pauta de cassação — ao lado de outras representações, como a da deputada Carla Zambelli (PL-SP) — e foi retirado à força por agentes da Polícia Legislativa.

O fato de a Câmara ter pautado simultaneamente pedidos de cassação de parlamentares de contextos tão distintos intensificou a percepção de “dois pesos e duas medidas”. Se o Plenário tivesse cassado apenas Glauber, enquanto mantinha ou arquivava outros casos, isso poderia ser interpretado como tratamento desigual de condutas supostamente semelhantes — algo que foi amplamente discutido nas semanas que antecederam a votação.


Limites institucionais e disciplina parlamentar

O episódio reforça a necessidade de estabelecer limites claros para a atuação dos deputados, inclusive no que diz respeito a condutas que possam ferir o decoro parlamentar. Ao mesmo tempo, a forma como o processo foi conduzido e a ampla repercussão pública demonstraram a sensibilidade do eleitorado e dos próprios parlamentares em relação ao equilíbrio entre sanções disciplinares e preservação dos mandatos populares.


O poder da mobilização política e da articulação interna

Um dos elementos mais relevantes dessa história foi o papel da mobilização política e da articulação interna do PSOL e de aliados para defender o mandato de Glauber.

Após a aprovação do parecer pela cassação no Conselho de Ética em abril de 2025, a decisão correu em direção ao Plenário da Câmara. A base de apoio de Glauber trabalhou intensamente para transformar um cenário em que a cassação parecia possível — ou mesmo provável — em um resultado de suspensão. Essa articulação envolveu negociação com deputados de diferentes partidos, promoção de votos estratégicos e mobilização de aliados que entenderam ser preferível uma penalidade alternativa a uma perda total de mandato.

Além disso, a ampla repercussão pública — tanto nas redes sociais quanto na imprensa — criou um custo político elevado para uma cassação simples, levando parlamentares a ponderarem os riscos institucionais de um julgamento que pudesse ser percebido como injusto ou seletivo.


Contexto histórico recente de cassações na Câmara

Historicamente, a cassação de mandatos por quebra de decoro parlamentar na Câmara tem sido rara e geralmente ocorre em casos de grande gravidade ou escândalo — como foi com André Vargas (2014), cassado por envolvimento em esquema de corrupção ligado à Operação Lava Jato; Eduardo Cunha (2016), por ocultação de contas e obstrução de investigação; e Flordelis (2021), em razão do suposto envolvimento no assassinato de seu marido.

Comparado a esses casos — em que havia acusações de crimes graves e repercussão nacional — o episódio de Glauber, apesar de controvertido, se insere em outra dimensão de análise política e institucional. Isso ajuda a compreender por que o Plenário optou por uma pena alternativa à cassação.


A importância de respeito aos mandatos populares e ao equilíbrio entre os Poderes

A votação de ontem colocou em evidência um ponto crucial da democracia brasileira: o respeito aos mandatos populares e a necessidade de que qualquer sanção a um parlamentar seja proporcional, transparente e baseada em critérios sustentáveis. Ao mesmo tempo, não se pode ignorar a necessidade de que a própria Casa Legislativa preserve sua credibilidade e disciplina interna.

A decisão de suspender o mandato — em vez de cassá-lo — aponta para um equilíbrio delicado entre a punição por condutas inadequadas e a preservação de direitos políticos essenciais. Hoje, mais do que nunca, é fundamental que o Parlamento exerça seu papel com firmeza, mas também com responsabilidade, respeitando os princípios democráticos e o pluralismo que sustentam o Estado de Direito.